22/08/2025                                                                            
                                    
                                                                            
                                            2.3. Fatores contribuintes para os erros de enfermagem
Os erros na prática da enfermagem geralmente não ocorrem por negligência ou má-fé, mas sim como resultado de uma série de fatores que afetam o desempenho profissional, a capacidade de decisão e a segurança operacional. Esses fatores são chamados de fatores contribuintes, pois aumentam significativamente a probabilidade de falhas ao longo dos processos assistenciais.
Compreender esses fatores é fundamental para implementar estratégias preventivas, promover mudanças organizacionais e reduzir riscos na rotina de trabalho. A seguir, detalhamos os principais fatores que contribuem para os erros de enfermagem, especialmente em ambientes hospitalares.
1. Sobrecarga de trabalho e jornada excessiva
A sobrecarga de trabalho é uma das causas mais citadas pelos profissionais de saúde quando se trata de erros. Ela pode ocorrer por diversas razões:
Escalas de trabalho mal planejadas;
Plantões longos e ininterruptos;
Acúmulo de funções administrativas e assistenciais;
Déficit de profissionais na unidade;
Altas demandas em turnos críticos (como UTIs, pronto-socorros e centros cirúrgicos).
Quando o profissional de enfermagem está submetido a longas jornadas e um grande volume de pacientes, seu nível de atenção, concentração e julgamento clínico é naturalmente afetado. A fadiga física e mental compromete o raciocínio, a memória, a coordenação motora e a capacidade de tomada de decisão.
Consequências frequentes incluem:
Esquecimento de rotinas;
Troca de medicações ou vias de administração;
Má avaliação de sinais clínicos;
Falta de atenção aos protocolos de segurança.
Além disso, a sobrecarga favorece o burnout, uma síndrome ocupacional que leva à exaustão, desmotivação, distanciamento emocional e aumento do risco de erros graves.
2. Distrações, falhas humanas e automatismos
O ambiente hospitalar é, por natureza, dinâmico e sujeito a interrupções constantes. Distrações e falhas humanas são inerentes à atividade assistencial, mas podem ser minimizadas com estratégias adequadas.
Causas comuns de distração:
Interrupções frequentes durante a preparação ou administração de medicamentos;
Conversas paralelas em ambientes críticos (como a sala de medicação);
Utilização simultânea de múltiplos sistemas e equipamentos;
Alarmes e sinais sonoros que geram poluição sonora e sobrecarga sensorial.
Além disso, o fenômeno do automatismo também contribui para os erros. Profissionais com grande experiência podem, por repetição, executar tarefas de forma mecânica, sem a devida atenção ao contexto individual do paciente. Esse comportamento, embora comum, reduz o pensamento crítico e aumenta o risco de falhas graves.
Exemplos práticos:
Administrar uma medicação no horário habitual sem conferir a prescrição atual;
Registrar sinais vitais por hábito, sem realizar a medição no momento.
Para mitigar esse fator, é essencial manter vigilância ativa, promover pausas planejadas, revisar rotinas e utilizar checklists e duplas conferências, mesmo em atividades rotineiras.
3. Falhas sistêmicas e ausência de protocolos padronizados
Nem todos os erros de enfermagem decorrem de falhas individuais. Muitas vezes, o erro é apenas a ponta visível de um problema estrutural no sistema de saúde, como:
Ausência de protocolos institucionais para procedimentos críticos;
Falta de padronização de rotinas entre os turnos;
Deficiência de materiais ou equipamentos;
Ambientes desorganizados, sem delimitação clara de funções e responsabilidades;
Sistemas informatizados com falhas técnicas ou mal configurados.
Esse tipo de falha é chamado de erro latente: está “adormecido” no sistema e cria o terreno fértil para que erros ativos aconteçam.
Por exemplo, a falta de um protocolo padronizado para passagem de plantão pode levar à omissão de informações importantes. Do mesmo modo, a ausência de treinamento periódico dificulta a atualização dos profissionais e a adesão às melhores práticas.
A solução para esses problemas exige comprometimento institucional, investimento em qualidade assistencial, auditorias internas, capacitação continuada e uma liderança de enfermagem atenta às fragilidades da unidade.
4. Comunicação ineficaz entre profissionais
A comunicação entre os membros da equipe multiprofissional deve ser clara, objetiva, oportuna e centrada na segurança do paciente. No entanto, falhas comunicacionais ainda são uma das principais causas de erros evitáveis em enfermagem.
Cenários típicos de comunicação ineficaz:
Passagem de plantão apressada ou sem foco clínico;
Falta de alinhamento entre enfermeiros e médicos sobre condutas;
Divergência de informações entre setores (ex: UTI e centro cirúrgico);
Não utilização de sistemas de registro padronizados;
Equipe de enfermagem que não se sente ouvida ao sinalizar riscos.
Além disso, aspectos subjetivos como hierarquia excessiva, medo de retaliação ou insegurança para questionar ordens também silenciam os profissionais diante de situações de risco.
Para superar esses obstáculos, é necessário adotar estratégias como:
Implantar o uso do SBAR como ferramenta padrão para comunicação clínica;
Promover reuniões de equipe com escuta ativa e discussão aberta de casos;
Utilizar registros claros e objetivos no prontuário;
Estimular uma cultura organizacional baseada em cooperação, transparência e respeito profissional.
Conclusão do item 2.3
Os fatores contribuintes para os erros de enfermagem são múltiplos e interdependentes. Eles não apenas afetam o desempenho do profissional, mas também expõem o paciente a riscos muitas vezes evitáveis. Reconhecer esses fatores não é buscar culpados, mas identificar oportunidades de melhoria.
A construção de um ambiente de trabalho mais seguro passa pela redução da sobrecarga, pela valorização da comunicação clara, pela organização do sistema de trabalho e pela adoção de protocolos efetivos e bem compreendidos por toda a equipe.
Ao compreender essas origens, o profissional de enfermagem se fortalece para atuar de forma mais crítica, ética e segura em todas as etapas do cuidado.