16/06/2025
Saudações a todos!
Muitos de vocês - amigos dos tempos de ioga, ex-alunos e colegas de profissão - têm visto minhas postagens recentes sobre o mundo das águas abertas e me perguntado se eu abandonei de vez a prática e o ensino de ioga. A resposta é não. Mas poucos de vocês sabem da relação íntima que essas duas práticas assumiram na minha vida há pelo menos 23 anos.
Para início de conversa, comecei a praticar ioga e a nadar exatamente na mesma semana, lá nos idos de 2002. Sim, eu aprendi a nadar tardiamente, mais precisamente no dia 14 de fevereiro daquele ano, no dia exato em que completava 27 anos. Portanto, se existiu alguma vez alguma relação de anterioridade da ioga em relação à natação, ela não foi superior a 24 horas (já que fiz a aula experimental de ioga na segunda-feira e a de natação na terça). E ainda que eu já tivesse tido algumas experiências com meditação antes, foi com a prática da ioga que ela ganhou corpo, disciplina e método (vários, na verdade).
Quatro meses depois do primeiro contato, deixei o Brasil, mas continuei com essas duas práticas nos 7 anos em que estive fora do país, ainda que de maneira intermitente e, muito a contragosto, alternada. Não que eu não quisesse praticá-las paralelamente, mas naqueles tempos eu tive que fazer opções difíceis em face de outras obrigações que havia assumido para mim. Portanto, foi somente a partir de 2010 que as duas práticas voltaram a coabitar o meu cotidiano. E de lá para cá, nunca mais as abandonei.
Mas o que eu quero ressaltar aqui é que a prática da ioga e da meditação me dão um suporte fundamental para que eu encare os desafios próprios do mundo das águas abertas, e que vão muito além do ganho de mobilidade ou da autorregulação física e emocional. Eu explico: o que me levou a aprender tão tardiamente a nadar foi um afogamento aos 6 anos de idade. Apesar de amar estar em contato com a água, o medo de um novo afogamento me manteve com os dedos grudados na borda da piscina e me fez passar vaaaaaaaários perrengue no mar na juventude, até ganhar o sugestivo apelido de “machado sem cabo” (isto é, aquela que vai sempre para o fundo). Parte substancial desse medo foi superado com o aprendizado da natação em 2002. O problema é que, nos vários anos de prática constante e solitária de natação em piscina que se seguiram, muitos hábitos se instalaram de forma viciosa na minha prática. Dentre vários deles, o hábito de respirar sempre pela direita, na frequência 4 x 1.
Pois bem: isso só foi virar um “problema” quando, durante o primeiro ano de pandemia, os clubes e quase todos os espaços de interação pública estavam fechados, e eu tomei a decisão de começar nadar em águas abertas, para nunca mais f**ar sem nadar novamente. E eu sabia que, para nadar em águas abertas, teria que flexibilizar este hábito e aprender a respirar bilateralmente. Bom, para quem nunca se afogou, esta parece uma tarefa fácil. Mas quem já experimentou debater-se no fundo da água e foi resgatado por alguém, qualquer limitação respiratória pode ganhar proporções enormes. E foi assim que experimentei minhas primeiras crises de pânico na água em fevereiro de 2024, a maioria delas na piscina, durante os treinos, e em duas ocasiões em águas abertas propriamente dito.
Vale ressaltar que, durante os anos da pandemia, na qualidade instrutora de ioga e meditação, tive que lidar cotidianamente com quadros de pânico entre os meus alunos, alguns deles, inclusive, sem nenhum histórico de crise. Cheguei até a desenvolver um protocolo para debelar crises de pânico, de tão comum que isso passou a ser no meu dia a dia. Mas tudo isso acontecia fora da água e, nela, quando se trata de respiração, todos os protocolos empregados em terra firme se tornam inviáveis. Agora, tinha chegado a hora de lidar com as minhas próprias crises de pânico, eu que, como muitos durante a pandemia, nunca tinha experimentado esses eventos antes.
Foi neste momento preciso que a prática constante e disciplinada da meditação me forneceu os recursos necessários para entrar em contato profundo com estes medos, ao invés de evitá-los e manter uma prática viciosamente confortável. Só a meditação te ensina a manter o distanciamento de um “observador”, que reconhece (mas não se identif**a com) emoções viscerais, como aquelas que estão envolvidas em uma experiência aparentemente simples de aprender a respirar para os dois lados. Ao perceber o início das crises, aprendi também a debelá-las logo no aparecimento dos primeiros sinais. E assim pude ganhar confiança e progredir tecnicamente, não só na respiração bilateral, como na alternância consciente entre vários tipos de respiração possíveis. Claro, neste processo de aprendizado, o Método Feldenkrais foi fundamental também, mas este será o tema de muitas e muitas postagens futuras.
Isto posto, é verdade que a prática da ioga foi determinante para que eu tivesse a energia necessária para atravessar os momentos mais difíceis da minha vida: perdas, mudanças, finalizações. Mas também é verdade que foi a natação que me ajudou a sustentar todas essas mudanças. O que une ambas as práticas é o gosto por estar consigo mesmo, voltado para dentro, para o mundo das sensações e dos pensamentos. É necessário criar uma familiaridade profunda com este mundo interno, se você quiser fazer dessas duas práticas uma fonte de nutrição e equilíbrio. Ambas me ensinaram a ter disciplina, paciência e uma vontade constante de conhecer e expandir limites, mas sempre de maneira respeitosa comigo mesma e sem me comparar com quem quer seja. Cada um é cada um, com sua trajetória, virtudes e desafios próprios. E segue o baile!
Resumindo, hoje não consigo me imaginar sem a ioga ou sem a natação. Na verdade, nunca me senti constrangida a optar por uma coisa ou outra, mas espero que esta longa reflexão tenha mostrado que as raízes das duas práticas podem estar entrelaçadas, como duas plantas robustas, em perfeita simbiose.
A você, que teve a infinita paciência de ler este texto até aqui, meu muito obrigada. Espero que esta reflexão tenha matado sua curiosidade, se é que você chegou a ter alguma. E, se não teve, ela f**a aqui como um “causo” a mais numa noite domingo.
E se você tem vontade de se aprofundar na prática da meditação, entre em contato comigo para conhecer as práticas de “Respiração, relaxamento e meditação” que comecei a conduzir na época da pandemia e que estou morrendo de vontade de retomar.
Respirem fundo e até a próxima!