25/02/2019
.comportamental ()
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Engole o choro. Engole sapo. Não diga, não quero saber. Cala a boca, cala o peito, cale-se! Mas o corpo fala, e como fala. Fala a ponta dos dedos batendo na mesa, fala o dente acirrado, rangendo estridente. Falam os pés inquietos na cama. Falam os olhos caindo tristonhos. Fala dor de cabeça, dor na alma. Fala gastrite, psoríase, fala ansiedade, fala memória perdida. Fala o corpo curvado, fala o nó na garganta atravessado. Fala angústia, fala ruga. Fala insônia, fala sono demasiado. .
É impossível entrar no tatame da vida sem levar uns tapas dela. Mágoa, tristeza, dor, raiva, são sentimentos que nos atravessam sem pedir licença. Emoções engolidas e não digeridas corroem feito ácido. A gente finge que não ouviu, engole as coisas, e esse mal entendido vira coisa que entra no estômago, percorre a garganta, o peito, e se deixarmos, calará nossa boca e nossa paz por uma vida inteira. As pessoas adoecem porque guardam emoções não digeridas dentro de si. .
O importante é não deixar acumular ou achar que vai simplesmente aliviar com o passar dos dias. O tempo tem um papel importante, mas não resolve tudo. Tentar mostrar que está tudo bem, requer muita energia. É preciso de coragem para se fazer falar. Não dá pra engolir tudo e dizer amém! Eu sei. Também não dá pra cometer sincericídios por aí. Mas dá para expressar. Tem hora que o sentimento pede pra ser dito, entendido, descodificado, traduzido. Tudo que ele quer é ser exorcizado pela palavra ou pela via que lhe cabe melhor. Expressar tranquiliza-a-dor. Dor não é pra sentir pra sempre. Dor é vírgula.
Então diz! Faz uma carta, um poema, um livro. Faz uma orquestra tocar. Pega as sapatilhas, sapateia. Faz uma aquarela. Faz uma vida. Faz lá, sol, manda a dó se catar. Faz piada, faz texto, faz quadro, faz encontro com amigo. Faz corrida no parque. Fala pro seu analista, psicólogo, discute com Deus, se pinta de artista. Conversa sozinho, papeia com seu gato, cachorro, berra aos céus, mas não se cala. Fala, vai. Pois “se você engolir tudo que sente, no final você se afoga”. .
Ruth Borges para Revista Bula.