21/03/2024
Em dia da poesia falar sobre este fim de ciclo poético.
Em 2023 fiz declamações em 12 locais diferentes entre restaurantes e fábricas.
Em 2024, neste Março, em 20 locais diferentes. Foi intenso. Foi longo e é sempre curto.
Algumas peripécias nesta edição:
➡️ construí e disse um poema a partir da ementa de um restaurante depois de me estenderem a mesma e dizerem “inspira-te!” - levo desafios a sério;
➡️ convidei pessoas, no momento, para dizer junto - Abril não se faz sem envolvimento e participação;
➡️ escolhi poemas na hora, para dizer sem ensaios, escritos pelos operários para o concurso “poesia na hora” (já disse que gosto mesmo de desafios?! E que acho que todo o bom plano tem que contemplar espaço para o gostinho do improviso?);
➡️ disse Maria Teresa Horta ao almoço a uma senhora que fez questão de me dizer que comprou as “novas cartas portuguesas” mal saíram;
➡️ a mesma senhora parou intencionalmente junto a mim, antes de sair do restaurante, para sussurrar um poema que também conhecia, acompanhando-me, enquanto eu estava a dizer 💛;
➡️ ouvi “tanto faz” quando pergunto se posso dizer um poema e ver, depois, olhos humedecidos que denunciam que se viveu um poema;
➡️ visivelmente emocionada outra pessoa pediu-me “Não leias mais, não posso ouvir mais, desculpa! Como é que te chamas?” (mal educada!, cogito, lê poemas olho no olho e nem sequer diz o nome), “Oh Mariana, tu fazes isto muito bem!”;
➡️ iniciei as declamações em fábricas com a frase “A poesia vai acabar” e ouvir quase sempre resposta “A poesia vai acabar?! Ainda nem começou!”.
Depois de tudo isto dizer que gosto mesmo da poesia-abraço, poesia-provocação, provoca-ação. Que diz menos de mim e que te diz mais a ti. De ti.
Que te faz sentir por dentro. Gosto da poesia arma-apontada-ao-coração que te faz encontrar-te, ouvir-te, sentir-te, olhar-te por dentro (sendo que o olhar por dentro por vezes é encontrar outros!).
Por isso poesia é para mim uma oportunidade de intervir também no âmbito da psicologia.
Há uns anos escrevia no LinkedIn: “não sei o que vem primeiro se a psicologia, se a arte, mas esta é das perguntas que menos me importa esclarecer”. E há coisas que não mudam…
Continuo pasmada da vida neste playground. Fernando Assis Pacheco, um dos poetas homenageados deste ano, descrevia-se assim, um “pasmado da vida”. Para alguns isto pode soar a “um palerma”, “um ingénuo”. Eu vejo tudo isto mas também “um feliz”. E gosto.
Não estou sempre pasmada da vida, às vezes estou aborrecida da vida, zangada da vida, triste da vida. Tudo isso também cá entra. E faz parte de viver pasmada da vida. Mas abençoados estes momentos em que estou “pasmada da vida”, de encantada, de deslumbrada…
Numa das declamações tive direito a um comentador paralelo “Maravilha”. Eu dizia uma frase, ele inseria um comentário. Outra peripécia que podia ter sido destacada. Eu dizia “Os homens nasceram para ter asas” e ele comentava “nunca vi um homem com asas!”. Eu também não, mas sinto que asas se carregam no coração. E sentem-se mesmo por dentro, às vezes.
Este ano dada a temática tão forte - a celebração dos 50 anos do 25 de abril - ao início questionei-me se estaria suficientemente “dentro” para estar à altura. Às vezes não faço mesmo ideia do privilégio que é ter nascido em ‘88 e fazer este one-woman-poetry-show enquanto um lugar que não questiono. Sei que seria bem menos feliz se não o pudesse fazer…
Se há momentos em que sinto que vivo com os pés um pouco acima do solo são estes, meus amigos, são estes!
(Foto de Sérgio Tavares Ferreira que estava na assistência de um dos locais - é sempre mais bonito o olhar do lado de lá, juro que aqui quase que vejo as asas!)