
15/07/2025
Quando o Banho Fere a Alma: o Corpo Nu, a Memória e o Orgulho Esquecido
Cuidar de alguém com demência exige mais do que paciência.
Exige escuta, respeito e sensibilidade.
Entre os muitos desafios do dia a dia, poucos momentos são tão íntimos — e, para muitos, tão cruéis — quanto a hora do banho.
Muitos filhos relatam resistência.
Dizem que o pai ou a mãe "não quer tomar banho", que ficam agressivos, gritam ou se retraem.
Mas o que quase ninguém vê — e poucos conseguem compreender — é que, por trás daquela recusa, pode haver dignidade ferida.
Porque, sim, há lapsos de memória... mas há também lampejos de lucidez.
E, nesses lampejos, ele se lembra.
Ele lembra que era o chefe da casa, o provedor, a autoridade.
Que sua palavra era lei, que sua força sustentava tudo.
Ela se lembra que era independente, vaidosa, dona da própria rotina.
E agora... está ali, nu diante do próprio filho, ouvindo comandos, ordens, às vezes até gritos.
Imagine o que é isso para um homem que, por anos, sustentou a casa com o suor do rosto.
Ou para uma mulher que organizava tudo nos mínimos detalhes, agora vendo-se sem saber onde está o sabonete, onde foi parar sua intimidade.
Há momentos em que o corpo é só corpo.
Mas há outros em que ele carrega a memória da autoridade, da história de uma vida inteira.
E quando esse corpo está nas mãos de quem um dia foi guiado por ele, a dor pode ser imensa.
Não há humilhação maior para quem, mesmo doente, ainda guarda um pouco de si.
✨ Ao cuidador, um lembrete:
Antes de insistir no banho, antes de levantar o tom, antes de chamar de “teimoso” — respire.
Talvez ali esteja apenas alguém que ainda sabe que já foi grande… e que agora se vê pequeno, exposto, vulnerável.
Que possamos acolher com mais empatia.
Porque cuidar também é enxergar o que não é dito.