04/01/2024
Se eu fosse eu é uma questão engraçada a se pensar, pois claro que eu sou eu, quem mais poderia ser a não ser a mim mesma?
Ou eu sou aquilo que acho que devo ser? Ou melhor ainda, sou o que acho que os outros acham que eu deveria ser? Ou sou coisa nenhuma? Afinal, quem eu sou?
Talvez se eu fosse inteiramente eu, ninguém me reconheceria como tal. É bem provável que eu esqueceria de vestir roupas, pentear os cabelos, lavar o rosto, amarrar os cadarços. Se eu fosse inteiramente eu, não sairia da cama se não fosse pelas razões mais necessárias. Talvez teria bom humor grande parte do tempo e não aceitaria provocações. Não me preocuparia mais com a opinião dos outros, inclusive não teria mais medo, não teria mais vergonha, não sentiria mais culpa. Diria sim quando quisesse dizer sim e diria não quando quisesse dizer não, parece até uma tarefa simples, mas de simples não tem nada.
E o que somos, se não somos nós?
Onde o nosso eu verdadeiro está?
Quando é que ele aparece? Será que é quando fazemos coisas impulsivas, falamos a verdade “sem querer”, quando brincamos? Somos mais nós quando choramos ou quando sorrimos? Quantas defesas criamos para nos escondermos do mundo e de nós mesmos? Quantas barreiras temos que enfrentar até chegar ao nosso mais profundo e nos roubar, nos trazer para fora, nos trazer à vida, nos dar vida?
Quem você seria se você fosse você?
Nós estamos tão acostumados a deixar de sermos nós pra caber que acabamos não sabendo o que seríamos se fossemos. O mundo já criou um roteiro, e realmente talvez seja mais fácil segui-lo do que confrontá-lo.
O que as pessoas seriam se cada uma se preocupasse primeiro em ser para si e depois ser para o outro? E se sendo para si, talvez houvesse compreensão do que é o ser do outro?
Como diria Jung: "Quem olha para fora sonha, quem olha para dentro desperta." Despertar é uma tarefa complicada, exige muito mais ousadia do que qualquer outra coisa. Despertar talvez signifique ser a única bolacha quebrada do pacote, uma música fora de ritmo, uma coreografia descompassada.
Mas talvez também faça as coisas valerem muito mais a pena.
Por isso, me contento com essa interminável construção de mim.