02/06/2025
Hoje acordei pensando em Rubem Alves. Aliás, é perigoso ler Rubem Alves. Ele te rouba as certezas, desmancha as estruturas, e de repente você se vê perguntando: “E se tudo aquilo que eu penso ser, na verdade, seja só aquilo que me falta?”
Rubem dizia que escreve não sobre o que tem, mas sobre o que lhe falta. É curioso isso... E mais curioso ainda é que ele também dizia que não se deve querer conhecer de perto um poeta. Vê-lo de carne e osso é como ver a cozinha de um restaurante: desmancha-se o encanto, desfaz-se o feitiço.
Talvez seja por isso que, às vezes, me sinto desconfortável na vitrine das redes. Ali, as pessoas me veem através das palavras, das teorias, dos ensinamentos. Constroem de mim uma imagem que não é bem... eu. É uma moldura bonita, mas não me cabe inteira.
Quando chegam ao consultório, percebo — mesmo no silêncio, que às vezes fala mais alto que a fala — que carregam um desejo secreto: encontrar aquela que idealizaram. Esperam a psicóloga que tem todas as respostas, como quem abre um livro em busca de fórmulas.
Mas... ah... ser psicóloga não é ser uma coleção de teorias encadernadas. É, antes, ter a coragem de se despir delas. Porque se eu me visto só das teorias, não te vejo. Vejo apenas o que aprendi. E você não é um manual.
Então, eu me sento diante do outro — que também não sei quem é — e me dou conta de que também não sei quem serei. Porque esse “Eu”, que na língua portuguesa é singular, na linguagem da alma é plural. E eu nunca sei qual de mim surgirá.
Não controlo.
Há um “eu” que é todo acolhimento, outro que é silêncio, outro que é riso, outro que se perde junto com quem se perdeu — e juntos tentamos encontrar algum caminho. Nenhum deles é o ideal. Nenhum deles é aquele que projetaram.
E quer saber? Está tudo bem. Hoje, estou em paz com isso. Não sou o que esperam. Não sou o ideal de ninguém. Só posso ser aquilo que, nesse exato encontro, surge de mim.
Se Rubem Alves estivesse aqui, talvez dissesse que isso também é poesia.
Com carinho Karina ❤️