25/12/2024
O Natal, em sua essência, é uma celebração de nascimento, renovação e união — valores profundamente ligados ao feminino e ao trabalho das mulheres desde os primórdios da humanidade. Embora atualmente seja marcado por tradições cristãs e comerciais, suas raízes remontam a festividades ancestrais de celebração da vida, da fertilidade e da capacidade de criação, simbolicamente associadas ao papel das mulheres como nutridoras e cuidadoras.
Desde os tempos pré-históricos, as mulheres desempenharam papéis fundamentais na sobrevivência das comunidades. Além de gerarem e cuidarem dos filhos, eram responsáveis por coletar alimentos, preservar sementes, fabricar utensílios e organizar rituais que marcavam o ciclo da vida. Segundo a antropóloga Riane Eisler, em sua obra O Cálice e a Espada, as sociedades matrifocais da Antiguidade reverenciavam o feminino como símbolo de abundância e criação, associando mulheres a divindades ligadas à Terra e à fertilidade.
Esses valores transcendem culturas: nas celebrações celtas do Yule, no solstício de inverno, a figura da mulher era associada à Deusa-Mãe, que dá à luz à luz renovada do sol. Já no Egito Antigo, o nascimento de Hórus, ligado à maternidade de Ísis, inspirou mitos que ecoam até os dias de hoje nas narrativas cristãs sobre Maria e o nascimento de Jesus.
Com a institucionalização do Natal pelo cristianismo, a história passou a destacar o papel masculino, mas a força feminina permaneceu no subtexto. A figura de Maria, por exemplo, é o eixo da narrativa da Natividade, representando a força, a resiliência e a capacidade de criar vida em meio a adversidades.
Além do simbolismo, o trabalho das mulheres sustenta as festividades até hoje. Elas são, historicamente, as responsáveis por preparar os lares, organizar os banquetes, comprar presentes e transmitir tradições. Pesquisas mostram que, mesmo em sociedades contemporâneas, o peso do trabalho doméstico e emocional durante as festas recai desproporcionalmente sobre as mulheres. Segundo um estudo da ONU Mulheres (2019), as mulheres realizam, em média, 76% do trabalho de cuidado não remunerado no mundo — uma carga que aumenta em períodos como o Natal.
As festividades natalinas refletem, de certa forma, o que as mulheres representam há milênios: a capacidade de transformar recursos limitados em abundância, de manter vivas as conexões humanas e de criar significado em meio ao caos. O Natal, em sua essência, é uma homenagem ao cuidado invisível, ao trabalho diário e à resiliência feminina.
Portanto, quando celebramos o Natal, estamos, consciente ou inconscientemente, celebrando a força das mulheres - das agricultoras pré-históricas às mães contemporâneas, das parteiras às cuidadoras emocionais, que continuam sendo a espinha dorsal das festividades e da humanidade. É preciso reconhecer e valorizar esse papel, não apenas na história, mas também em nossas ações cotidianas, para construir um futuro mais igualitário.
Que neste Natal possamos honrar essas mulheres — as do passado, que moldaram a sociedade, e as do presente, que sustentam a magia das festas com sua força e dedicação.
Kawane Cândia