
10/07/2025
As eleições sindicais entre médicos frequentemente se tornam palco de disputas intensas, ressentimentos e ataques pessoais, revelando um roteiro inconsciente que se repete ciclicamente. Como médico e psicanalista, observo que esses conflitos transcendem diferenças ideológicas, envolvendo desejos de reconhecimento, frustrações profissionais e identificações inconscientes. Proponho um olhar psicanalítico que busque compreender, sem julgar, os mecanismos afetivos e pulsionais que emergem na organização coletiva dos médicos.
Os sindicatos médicos, sob a fachada de discursos políticos e reivindicações, escondem um campo pulsional que reflete tensões entre ideal e realidade, onipotência e impotência. Essas tensões se manifestam em polarizações, como a divisão entre “os que lutam” e “os que se acomodam”, reproduzindo fantasmas arcaicos de heróis e traidores. Essa lógica projetiva, onde o outro é visto como covarde ou conivente, rigidifica os conflitos, dificultando negociações.
O sindicato funciona como um sujeito coletivo, sustentado por identificações com ideais de justiça e valorização, mas também por disputas narcísicas pelo lugar de liderança. Para muitos médicos, ele representa a esperança de reparar o sofrimento causado pela desvalorização profissional, precarização e alienação. Quando essa expectativa falha, surge uma raiva pulsional, transformando assembleias em cenas edípicas de rivalidade e destruição.
Psicanaliticamente, os conflitos sindicais são sintomas de clivagens na subjetividade médica: entre o desejo de reconhecimento e a alienação, o cuidado idealizado e o desamparo institucional. Para superá-los, é necessário um espaço simbólico seguro, onde diferenças sejam acolhidas sem se tornarem ameaças. O líder sindical deve atuar como mediador, reconhecendo limites e frustrações, sem sucumbir ao narcisismo.
A psicanálise pode ajudar a desidealizar o sindicato, promovendo simbolização e elaboração. Um sindicato que enfrenta o inconsciente torna-se mais potente, sustentando a alteridade e o desejo sem ceder à destruição. Em tempos de fragmentação, transformar conflitos em trabalho é a tarefa urgente.
Dr Leonardo Sodré, PhD
Médico Psiquiatra e psicoterapeuta