
06/05/2024
Reposted from AQUELA HUMANIDADE NA BANDEIRA E UMA CHARGE ABSURDA
Fabrício Carpinejar
É um luto. Não morreu unicamente um ente querido, não morreu unicamente uma pessoa próxima, morreram cidades inteiras num estado agonizante.
Você acorda e não acredita naquilo que lembra. Pensa que foi um pesadelo, que dá para voltar atrás no tempo, que se trata de um engano, que haverá um jeito de cancelar a destruição e rebobinar a chuva.
Mas é um luto. Um luto cruel, irreversível e real.
Você demora a compreender e admitir. Precisa de provas visuais, caminhar pelos escombros, e enxerga o rio cheio, casas enlameadas e vazias, um desespero mútuo em cada um que passa pela rua.
E não entende como o mundo continua seguindo como se nada tivesse acontecido, não entende as rodadas do Brasileirão, não entende como pode ter havido show da Madonna no Rio de Janeiro com milhões de pessoas em Copacabana, sem que ninguém lá mencionasse em nenhum momento a nossa enchente, não entende a demora para mobilizar frota de helicópteros, não entende o quanto somos matérias secundárias nas capas dos jornais do Sudeste, não entende charges absurdas e infelizes dizendo para não chorar senão vai alagar mais, não entende como nossa ausência não faz falta, como nossa falta não faz saudade.
Na bandeira do Rio Grande do Sul, existem três palavrinhas: Liberdade, Igualdade e Humanidade.
O que mais queremos é a última delas, a Humanidade. Esses gaúchos que sofrem são brasileiros sofrendo. Nem melhores, nem piores: brasileiros em completa situação de indigência e desamparo. Somos 11,4 milhões de brasileiros, 5,4% da população total.
Por que parece que não estávamos no Brasil no último fim de semana?
As cheias que afetaram 345 dos nossos 497 municípios, resultará infelizmente, ao longo do resgate nos próximos meses, na maior tragédia ambiental da nação, acima de Brumadinho em 2019 (270 mortos) e enchente no Rio de Janeiro em 1966 (250 mortos). A previsão assustadora é de 4 dígitos de óbitos.
Neste luto coletivo, não estamos pranteando por alguém, mas por nós mesmos. Pela primeira vez, sentimo-nos mortos diante de todos que vivem fora daqui. E ainda temos que encontrar forças para ressuscita