02/07/2025
Numa tarde abafada de verão, Alan Parker se trancou em sua sala de montagem. Lá dentro, o diretor revisava obsessivamente uma cena: um jovem prisioneiro em câmera lenta, olhos inflamados de fúria, mordia a língua do guarda até arrancá-la. Repetidas vezes, Brad Davis cuspia a língua de porco usada como prótese. Era um momento brutal, exagerado — e Parker sabia disso. Mais tarde, admitiria que “se empolgou”. Mas naquele instante, ele não pensava em diplomacia. Pensava em impacto. Pensava em traduzir, com a linguagem do cinema, a dor de estar encurralado num mundo sem saída.
O Expresso da Meia-Noite (1978), estrelado por Brad Davis, John Hurt, Paul L. Smith e Randy Quaid, não era apenas um filme sobre prisões. Era uma descarga emocional — escrita por Oliver Stone, dirigida por Parker, produzida por David Puttnam e embalada pela trilha pulsante de Giorgio Moroder. Baseado na história real do americano Billy Hayes, o filme retrata sua prisão na Turquia por tráfico de haxixe e os anos que passou tentando sobreviver ao sistema carcerário do país. Ganhou dois Oscars, foi aclamado pela crítica e se tornou cult. Mas também gerou um terremoto internacional. Durante anos, turcos protestaram contra o que consideraram um retrato desonesto, ofensivo, quase xenofóbico. O filme foi acusado de destruir sozinho a imagem da Turquia no Ocidente.
E talvez não tenham sido apenas acusações vazias. No filme, guardas turcos são sádicos, crianças são mostradas como grotescas e o sistema judicial parece uma roleta russa moralmente falida. Oliver Stone, anos depois, lamentaria o tom do roteiro. Alan Parker, embora defendesse seu trabalho, reconhecia que o filme havia gerado consequências que ninguém da equipe previra. Sally Sussman, diretora do documentário Midnight Return, entrevistou todos os envolvidos e chegou a uma conclusão simples, porém dolorosa: O Expresso da Meia-Noite foi feito “sem malícia”, mas com descuido. “Foi uma consequência não intencional”, afirmou.
A escolha de Brad Davis para o papel de Hayes foi uma das decisões mais conscientes da equipe — e também uma das mais arriscadas. A Columbia queria Richard Gere, mas Parker achava Gere “heróico demais”. Quer