25/09/2025
"Nietzsche era extraordinariamente sensível ao espírito da época; ele sentiu muito claramente que estamos vivendo, agora, em uma época em que novos valores deveriam ser descobertos, pois os velhos estão decaindo. Pois, assim que uma dúvida se torna óbvia, o símbolo morreu. Mesmo se apenas um homem ouse confrontar a Igreja, argumentar contra a autoridade dela, uma pessoa sensível está acabada se não pode refutar esse argumento. Ele percebe, de uma só vez, que o sistema todo morreu, por haver uma fenda ínfima em sua autoridade. Se ele não funciona mais, Deus se tornou vulnerável, e toda a vida esvaiu-se dele. Nietzsche sentiu isso, e, instantaneamente, de forma natural, todo o processo simbólico que tinha chegado ao fim no exterior começou nele próprio. Assim, ele tinha esse inconsciente terrivelmente tenso, ameaçador, que começava a desgastar a parede divisória, a irromper aqui e acolá. E isso, é claro, perturba o sono, de modo que ele, naturalmente, olha para trás com um certo pesar por uma época em que podia dormir, em que não estava preocupado.
Certa vez, discuti determinados problemas psicológicos com um professor, um católico muito bom, e ele disse: "Não vejo por que você deveria se preocupar com essas coisas. Se alguma coisa é duvidosa ou problemática, eu simplesmente pergunto ao meu bispo, e ele me diz tudo a respeito, e se ele por acaso não sabe, escreve para Roma, onde lhe dirão o que ele deveria pensar a respeito. Eles têm ali a autoridade; por dois mil anos, as cabeças mais inteligentes do mundo estudaram esses problemas. Por que eu deveria imaginar que poderia resolvê-los? Não sou um especialista". E, assim, ele tinha, com certeza, um sono muito bom e uma digestão muito boa; ele não é perturbado, porque não há nem mesmo uma ínfima fenda na autoridade. Mas isso não era assim para o pobre Nietzsche."
Jung - O Zaratustra de Nietzsche págs. 461/462 Volume.1 - versão e-book.