Entre Uma e Outra - Enlaces Psicanalíticos

Entre Uma e Outra - Enlaces Psicanalíticos Duas psicólogas envolvidas na transmissão da psicanálise.

Beatriz Rodrigues Caldas Lourenção - CRP 08/30932 (43)99147-3702 / (14)981576880
Isadora Nicastro Salvador - CRP 08/24816 (43)99971-7717

Esses dias vi um galho de árvore parado no meu parabrisa e me lembrei de algo simples, mas que foi passado como uma hera...
24/08/2025

Esses dias vi um galho de árvore parado no meu parabrisa e me lembrei de algo simples, mas que foi passado como uma herança transgeracional na minha família.

Quando não estávamos em casa e minha avó ou as irmãs dela iam nos visitar, deixavam um galho entrelaçado no portão. Chegávamos e sabíamos que a minha avó tinha passado por ali, mas, como não encontrou ninguém, mostrou que esteve e se foi.

Lembro do dia que eu estava com ela, fomos visitar alguém e ela reproduziu esse feito. Agora, eu não era aquela que via o galho sem a minha vó. Eu era a que via a casa vazia e punha o galho.

Eu sempre sorria quando chegava em casa e encontrava isso. Não era a minha avó, mas era o galho que a representava. Em tempos sem WhatsApp, ela havia passado e não conseguia se comunicar nesse momento, mas fazia questão de deixar rastro.

Em outro dia, em uma conversa com uma amiga, ela me conta que havia adoecido depois de alguns dias muito gostosos de comemoração do seu aniversário. Outra pessoa que conheço também conta que, depois de um show muito importante em sua carreira e de muita entrega, ficou de cama.

Tenho ouvido essa música do Belchior no repeat por aqui. Sempre me pego pensando nessa frase. "A felicidade é uma arma quente". A arma pela qual a bala já passou, já atingiu, já foi. A arma que f**a quente depois, mas quente pelo rastro da bala, pela ausência dela, e não porque está preenchida. A felicidade, essa que já foi, que já se esvaiu, que é uma fração de segundo.

Ficamos com as marcas. Do show, da festa, da minha vó. Mas, como o galhinho que tirávamos do portão para entrar em uma casa sem ela, há que se estar atento ao tempo. Esse que vem é vai e carrega com ele a felicidade.

"Aproveitem a vida, porque o tempo passa muito rápido", me disse ontem uma velhinha no parque, com toda a sabedoria e a experiência do que já passou.

"João, o tempo andou mexendo com a gente, sim", diz Belchior.
Aproveitemos enquanto a bala atravessa a arma. Dura pouco, mas causa.

- Isadora Nicastro Salvador

Eu sempre dou risada ao ouvir minha mãe, no alto de seus 63 anos, referindo-se ao meu avô, que faleceu com 97 anos muito...
10/08/2025

Eu sempre dou risada ao ouvir minha mãe, no alto de seus 63 anos, referindo-se ao meu avô, que faleceu com 97 anos muito bem vividos, como "papai".

Minha tia que faleceu depois dele, aos 74 anos, também continuava a chamá-lo assim até a sua morte. Minhas outras tias e meu tio o chamam assim até hoje.

Vi esses dias um vídeo de uma senhora de quase 60 anos sendo cuidada no hospital por seu pai, um senhor de 80+, no qual dizia que não há idade para continuar sendo a eterna filhinha do papai.

Recebo pacientes que começam a falar dos problemas com os pais e logo dão risada: "ah, mais uma com a questão do pai". Será que tem como os pais não serem questão? Um completo e qualquer desconhecido em oposição à relação simbiótica da mãe e da criança vira um pai e pronto, a questão já está posta.

Ouvi uma entrevista de Gilberto Gil muito novo, falando do nascimento da filha Preta. Dizia que, quando Preta nasceu, ele chorou por oito dias seguidos. Só depois percebeu o que o fazia tanto chorar. Era o fato de a nova filha marcar um tempo. O tempo que havia sido antes, que ele havia perdido, e o tempo novo que se iniciava com a presença da filha.

Um filho marca um tempo para o pai. Transforma as velhas formas do viver, como o próprio Gil canta.

E nós, os filhos e filhas, passamos a vida fazendo essa marca, que não é literal e nem no carnal, ressoar. Para a minha mãe e minhas tias, a marca do "papai". Para mim, a marca da presença se esvaindo, aos poucos. Como desenho na areia que o tempo desenha outro.

"Sentir é questão de pele
Amor é tudo que move", de novo com Gil.

Obrigada por me mover, pai.
E com isso, claro, os issues, daddy.

- Isadora Nicastro Salvador

“Os meus três são o simbólico, o real e o imaginário. (...) Eu dei isso aos meus. Dei-lhes isso para que se orientem na ...
09/04/2025

“Os meus três são o simbólico, o real e o imaginário. (...) Eu dei isso aos meus. Dei-lhes isso para que se orientem na prática”.

Real, simbólico e imaginário são três registros que, para Lacan, compõem a realidade humana. Sendo impossível de hierarquizá-los ou de considerá-los de forma isolada, os três registros darão suporte para a investigação teórica e clínica de Lacan e, portanto, para a nossa orientação na prática.

De um lado, teremos um grupo de estudos em que nos deteremos, junto com Lacan, a partir do estudo do Seminário da Carta Roubada, a articular as incidências imaginárias que observamos na clínica ao registro do simbólico e ao funcionamento da cadeia signif**ante, que as liga e orienta.

De outro, teremos o grupo de leitura do livro “Real, simbólico e imaginário no ensino de Jacques Lacan”, da Michele Roman Faria, a partir do qual vamos traçar um panorama da construção dos três registros ao longo da obra da obra de Lacan, podendo apreender de forma mais ampla como os registros aparecem e de desenvolvem.

Vamos juntos? 🌷

Os links para as inscrições está na bio!

Empresto essa frase de Paulinho da Viola para falar sobre o meu professor de literatura. Roberto Navarro era o nome dele...
03/04/2025

Empresto essa frase de Paulinho da Viola para falar sobre o meu professor de literatura. Roberto Navarro era o nome dele. Um sujeito excêntrico. Vestia-se com suspensórios, camisa de botão meio aberta, óculos ray-ban pretos e quadrados e tênis all star sujos.

Tinha uma voz que era meio radialista, meio poeta, meio ator de meia idade. Chegava na sala sempre acompanhado de seus velhos livros. Ora começava escrevendo na lousa palavras soltas, ora começava lá do fundo da sala, lendo um poema em alto e bom tom, enquanto o som das conversas dos alunos iam abaixando, até que f**asse apenas o som da sua voz. Então, sabíamos que a aula havia começado.

Alguns alunos sentiam vergonha alheia dele, e eu sentia vergonha, quase por osmose, por gostar tanto do seu modo subversivo. Tinha um cheiro de café com cigarro e, com frequência, eu o encontrava no horário de almoço, sentado em seu carro, com os pés e o all star sujo apoiados no volante, fumando cigarro, ouvindo Janis Joplin e lendo poesia. Era essa a sua fome.

Foi em uma de suas aulas que ele nos levou para a sala de computação e projetou na parede o filme "Freud Além da Alma". Eu já contei isso aqui e em outros lugares, quando perguntada sobre como e quando me interessei pela psicanálise. Foi ali. O meu brilho no olho, depois de assistir ao filme em preto e branco, fez com que ele me olhasse, suspirasse e me chamasse, da forma que sempre o fazia: "ah, minha aluninha Isadora...", acompanhado de um sorriso de dentes amarelos de um fumante antigo. Não disse mais nada, eu também não. Mas ele sabia.

Ele curtia os textos que eu postava desde muito antes daqui. Eu sempre pensei que devia mostrar para ele algum vídeo ou texto em que eu me referia a ele para dizer quem me apontou o desejo para a psicanálise. Mas não o fiz. Há poucos meses, fico sabendo de sua morte súbita. Pensei que devia ter dito antes de ele ir. Não disse.

Sempre dei risada da forma como ele assinava seus textos: "R. N.". Agora, depois de sua morte, acho que consegui captar o que ele queria dizer. Sim, Roberto Navarro, me sinto ainda uma recém nascida por aqui. As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender.

De uma eterna R. N.,
Isadora.

Há tempos não via maçã fuji à venda no mercado, com um preço razoável, ao menos. O que aconteceu com essa fruta? Maçã es...
19/02/2025

Há tempos não via maçã fuji à venda no mercado, com um preço razoável, ao menos.
O que aconteceu com essa fruta? Maçã estava aliada ao conjunto da banana, frutas que a gente sempre tinha em casa.
Agora, são difíceis de achar.
Enfim, encontrei uma bancada cheia. Vermelhas, grandonas e apetitosas.

A maçã argentina é muito fofa na boca. A da Mônica, muito pequena.
A fuji é a perfeita. Faz "croc" quando morde e ainda é suculenta.
Meu pai comia uma maçã por dia, na ceia. Aprendeu em alguma dessas revistinhas de saúde, famosas nos anos 2000.

Ele escolhia perfeitamente. Era difícil a proeza de comer uma maçã que ele havia escolhido e que não estava doce / suculenta / fazendo croc.
Ele dizia: "quanto mais vermelhas e durinhas elas estiverem, melhor. As com pintinhas rajadas pretas são as mais doces".

De volta à cena do mercado, eu em frente à bancada repleta de maçãs fuji. Pego uma, observo, aperto, deixo. Pego outra, coloco na luz, deixo. Pego outra, aliso e deixo.
Qual é mesmo a melhor?
Eu sei como escolhe, ele havia me ensinado.
Eu só não sou ele para escolher.

Depois de alguns minutos e com vergonha já das pessoas que me observavam naquele lugar, escolho umas três, coloco no s**o e sigo.
Não são as que ele escolheria e comeria. Agora ele nem as escolhe e nem as come.
Resta o que ficou marcado em mim daquelas maçãs.
Cortadas por ele e divididas para toda a família.
Descubro que essas maçãs não têm graça porque são inteiras.
Eu queria mesmo os pedaços.

Recebo a foto da minha mãe, por WhatsApp. É como se uma descarga fosse acionada dentro do meu corpo e me fizesse sentir ...
06/02/2025

Recebo a foto da minha mãe, por WhatsApp. É como se uma descarga fosse acionada dentro do meu corpo e me fizesse sentir aquela sensação de frio na barriga com aperto no peito com pontada no coração, termos esses que a língua portuguesa é mestra em tentar dizer o que não tem nome.

"Vende-se", dizia a placa de cores branca e vermelha, pendurada no portão da casa onde vivi dos meus 2 aos 17 anos de idade, e que só agora deixará de ser propriedade dos meus pais.

A foto me faz começar a repassar os momentos em que vivi lá. As festas de aniversário, os cafés da tarde, os encontros com pessoas queridas, muitas delas em que a morte já não me deixa mais encontrar. As reformas, os cheiros, as plantações, os animais, os vizinhos, os barulhos, as presenças. Tudo vem como um turbilhão na minha cabeça, que me faz sentar na cama para não cair.

Onde f**ará isso tudo? Como pode esse lugar que, em minhas lembranças, me era a coisa mais familiar, f**ar em posse de um estranho? Que vai mudar tudo: a disposição, as cores, os móveis, as palavras.

A partir daquele dia, em quase todas as noites, tenho sonhado com a casa. Há muito isso não acontecia. Que marca é essa que uma placa cifra?

A marca de uma ausência. Ali, já não se está. Estivera outrora. Outrora esse que não se volta mais.

Ciframento daquilo que falta, o importante conceito de falo para a psicanálise.

A sensação no corpo, ao acordar, continua. Frio na barriga com aperto no peito com pontada no coração.

E a casa lá, inundada de nada.

- Isadora Nicastro Salvador

Primeiro dia do ano. Falava para a médica sentada à minha frente que estava sentindo muita dor. Depois de algumas explic...
17/01/2025

Primeiro dia do ano. Falava para a médica sentada à minha frente que estava sentindo muita dor. Depois de algumas explicações, ela me pergunta:
"- Quer uma injeção pra dor?
- É muito dolorida?
- Vai te ajudar bastante a passar essa dor em menos tempo."

Aceito a proposta indecente.
Lá de dentro, com a enfermeira, faço uma pergunta parecida:
"- Dói muito?
- Menos que Benzetacil"

Nenhuma delas me respondeu que não doía.
Até porque, dor eu já estava sentindo.
Mas essa era outra.
Como posso explicar a diferença de uma dor interna pra uma dor que vem de fora pra dentro?
Além do fato de essa última se relacionar a lembranças e traumas também dolorosos, ora veja.
E ainda ter sido minha escolha. A médica era contra autoritarismos.

É tudo dor, você poderia me dizer.
Bem, não é bem assim.

Uma dor para passar a dor?
Qual era a minha preocupação com a dor que remedia, já que a dor que estava sentindo me fuzilava por dentro?

A resposta, agora, me vem de sopetão: é impossível que não doa.

Isso serve para injeções para aliviar a dor.
Mas também serve para análises.

- Isadora Nicastro Salvador

Isso tudo pra dizer Tenho ouvido essa frase com frequência e algo nela me incomoda. Fala-se o que parece ser tudo, mas q...
25/10/2024

Isso tudo pra dizer

Tenho ouvido essa frase com frequência e algo nela me incomoda. Fala-se o que parece ser tudo, mas que não se basta.
É preciso explicar o que queria dizer, mesmo tendo dito tudo. Como se o que viesse depois do dizer explicasse o tudo, mas não explica, só diz mesmo.
"Dizer tudo pra isso?" Penso nessa subversão e ela me ajuda um pouco com o incômodo.

"Isso tudo" parece que não diz nada. Isso tudo pra dizer nada. Nada disso para dizer tudo.

Ontem a carta de Antônio Cícero me disse. Com o nada, disse tudo.

Tenho escrito pouco. Sinto saudades do ato, penso no que quero escrever, mas depois, se evapora no ar. O que escrevo, geralmente, tem sido endereçado. Ou guardado. Às vezes, penso: "não tenho nada a dizer".

Engraçado. Eu que tinha tanto. Que tinha que cortar frases inteiras pra fazer caber. Sinto, agora, que foi muita falação. Tenho gostado mais do restinho que ficou, essas minhas palavras escritas a poucos. Há pouco.

Tudo isso pra dizer. E eu aqui sem fazê-lo. O que quero dizer, me escapa. Então eu marco o nada disso pra dizer tudo. Tudo isso pra nada dizer. Isso tudo para Cícero dizer o nada. Contornou o nada. E nos deixou "guardando" isso tudo pra dizer...

Isadora Nicastro Salvador

Uma semana dessa noite tão especial pra mim!Obrigada,  pela fala, pelas dedicatórias, mas principalmente, pelo papo, vin...
13/03/2024

Uma semana dessa noite tão especial pra mim!

Obrigada, pela fala, pelas dedicatórias, mas principalmente, pelo papo, vinho e comidinha gostosos depois disso.

Parabéns, pela condução e mediação fluidas.

E também ainda impactada com o título da fala ✨️ Obrigada por ele e por toda a organização!

E ao Sesc Cadeião, meu agradecimento já vem de tempos. Ainda bem que esse espaço existe em Londrina

Acordo ainda pensando nele.Era domingo, quase meia noite, e eu abri a conversa de WhatsApp com A nossa última conversa t...
06/02/2024

Acordo ainda pensando nele.
Era domingo, quase meia noite, e eu abri a conversa de WhatsApp com
A nossa última conversa tinha sido em 2021, alguns meses após a live que fizemos juntas. Abri a câmera voltada pra mim, direto da conversa com ela. Tirei uma foto do meu rosto inchado de tanto chorar.
Quase enviei, elogiando seu livro, com o porquê e o quanto ele tinha me deixado aos prantos.
Mas, cliquei na tecla "voltar". Pensei: um domingo à noite, isso pode fazê-la pensar de novo no seu pai, não vou ser a responsável por isso.
Como se já não pensasse...
Essas ausências nos assolam de forma tão específ**a e única, que seria pouco provável que uma foto minha causasse mais dor do que uma lembrança boba.
Esses dias, na mesa de um bar, ouvi a pergunta: "você não tem vergonha do que escreve? Todo mundo vê, todos têm acesso às suas intimidades".
Prontamente, respondi que não. "Cada um só pode ler com sua própria história, com seu próprio sofrimento. O nosso texto vira do outro e essa é a minha forma de me proteger".
Lendo o novo livro de Natalia, tive, mais uma vez, uma verif**ação disso. A história é dela, o pai foi dela, a família inteira narrada ali também é dela. O que então me fez, em uma madrugada de domingo, f**ar aos prantos daquele jeito?
Peguei o livro quando estava matando tempo em uma livraria do shopping. "As pequenas chances" estava escondidinho ali na área de "Romances brasileiros".
Encontrei uma poltrona, sentei e li duas páginas. Algumas adolescentes animadas estavam ao meu lado, fofocando, enquanto riam em alto e bom som. Eu, porém, já estava chorando.
Obrigada por nos deixar sentir a beleza do que é triste, como a cena que você descreve sobre a chegada da sua irmã no hospital, Nat.
Compartilho com você muitos sentimentos, como meu pesar por não ter descoberto mais de minha história quando eles ainda podiam contá-la.
Entretanto, o desejo de descobrir parece não ter tamanha voracidade quando podemos descobrir. A voracidade, nesse caso, só existe quando é um desafio.
Obrigada por me fazer lembrar do meu desafio diário.
(Me desculpe por te stalkear. Precisava achar a foto do seu pai e do seu filho carecas. Obrigada por ela também!),
Isa.

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