04/01/2024
O tempo de um novo ano irrompe, e sempre me parece um mistério o que se termina e o que começa com o que se dita no relógio do calendário.
Não é à toa que o desejo de escrever por aqui irrompeu ontem quando assisti pela quarta vez "Lucy", e consegui elaborar um ponto interessante em relação ao tempo. Assunto que foi percorrido nos estudos da Escola, mas também na minha análise, com acontecimentos que marcaram minha vida num antes e depois, neste ano que se foi. Lucy ensina algo indispensável: "O tempo é a unidade da matéria, sem o tempo não existimos." Ela coloca a imagem de um carro numa estrada, demonstrado que se esse carro é levado a um tempo infinito, ele deixa de existir. A velocidade do tempo foi trabalhada no seminário de orientação lacaniana com o capítulo de Miller "Os tempos que correm", nas Jornadas da EBP-SUL apresentei um caso clínico onde o tempo de espera orienta a direção da cura; e, na minha análise, apreendi que o tempo é um tom que atravessa o corpo, que ainda com a marca de um trauma inesquecível, a vida pode, consegue e necessita seguir. Apesar de, por causa de, tudo depende do tom possível em relação ao impossível que irrompe, a cada vez.
"Um dia de cada vez" é uma frase bastante usada quando algo intenso nos ocorre, mas parando pra pensar, tem como viver de outro modo que não seja um dia após o outro? a cada vez? A cada instante? Como saber se o tempo corre, se o tempo é devagar demais, se é por causa dele que existimos? O perigo, quem sabe, está no sem medida, tanto em relação ao rápido demais que esquece um tempo de compreender indispensável para existir, quanto ao devagar demais que estende o momento de concluir ao infinito. Poderia, esses dois extremos, apontar a uma defesa do que se perde no ritmo do tempo que transcorre? O tempo traz um ritmo com uma medida, e essa medida, ainda que haja um relógio, não é por ele que se constrói. O relógio até pode servir para uma estrutura social mas nada tem a ver com o desejo singular que exige outro ritmo, outra medida, para ser sustentado. Essa outra medida, diferente, singular e única, foi o que consegui começar a entender este ano que se foi e Lucy me ajudou a dar uma outra volta.
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