29/04/2017
SOBRE OS GANHOS IMEDIATOS, AS DOPAMINAS E O SEU CARTÃO DE CRÉDITO
Você já se viu em alguma situação na qual tinha que escolher entre um ganho imediato ou um ganho futuro mais proveitoso? Dou um exemplo para facilitar a resposta. Imagine-se num shopping, perambulando pelos corredores e lançando olhares a vitrines. Inesperadamente você vê um produto que você deseja desesperadamente comprar (seja um notebook ou uma roupa cara), mas que está muito além do que você pode pagar no momento. A sua mão entra sorrateiramente no bolso de sua calça e você toca a sua carteira num movimento, inconsciente a princípio, que lhe relembra que um possível acesso ao seu desejo está em suas mãos: o cartão de crédito. Tomado por uma motivação irrefreável você entra na loja, leva o produto ao caixa e entra na fila. Na espera para finalizar a compra com o seu salvador cartão de crédito, pensamentos incômodos pipocam na sua cabeça: “Ainda nem paguei as outras dívidas!”. Mas você se consola e cria justificativas muito convincentes: “Eu me esforço tanto na vida que mereço um agrado!”. Finalmente, você paga e leva o seu bem tão desejado para a casa e a lua de mel dura algumas horas ou minutos, mas, em algum momento, quando o prazer diminui, você se dá conta que os juros que você aceitou pagar de tão bom grado eram tão altos que apenas com eles você conseguiria para comprar um outro produto igual. Você não viu isso, ou melhor, viu, mas os números eram questões secundárias, então não se deu conta do negócio que fechou. Se houvesse esperado e juntado o dinheiro por alguns meses, teria poupado o suficiente para comprar o que queria e pagar aquelas dívidas.
O exemplo que dei acima é apenas um exemplo dentre muitas situações em que devemos decidir entre aguardar ou agir de imediato, e a vida nos confronta com essas escolhas o tempo todo. Mas o que faz com que você, eu e qualquer outra pessoa estejamos passíveis a cairmos nesta cilada? Os motivos são muitos e eu teria que escrever uma dissertação para responder a essa pergunta com alguma propriedade, mas posso dizer que uma das causas mais relevantes para a ocorrência dessas situações é a disposição do sistema límbico (uma parte medial do cérebro) pela busca da satisfação imediata. Ma***to sistema límbico! Não, não, amigo, respeite essa parte magnífica do seu ser! É por conta dessa região neural que você experimenta o mundo como um lugar prazeroso (embora ele possa tornar-se sombrio também por essa região, mas vamos deixar isso de lado agora porque estou tentando fazer uma pequena defesa aqui!), é por lá que as suas memórias mais felizes e agradáveis ganham cor e tudo que você experimenta de bom na vida só ganha esse adjetivo por causa dos componentes do sistema límbico. No entanto, tudo na vida tem dois lados, não?
Quando estamos diante de algo que desejamos (como a roupa ou o notebook), o cérebro, sobretudo a área tegmental ventral, produz um neurotransmissor chamado dopamina, que gera uma sensação de prazer e uma disposição para a ação motivada. As boas sensações aumentam quando estamos próximos a ter acesso ao que desejamos. A liberação da dopamina faz a motivação traduzir-se em ação. Isto tudo significa que a antecipação da recompensa (o momento em que você olhou o produto e considerou comprá-lo) pode ser até mais prazerosa que a recompensa por si mesma, ou seja, o momento da compra pode ser mais prazeroso do que quando você usou a roupa ou o notebook.
A boa notícia para quem já está se sentindo um refém do sistema límbico e das dopaminas é que toda essa onda de euforia criada pela antecipação da recompensa pode ser evitada se você adicionar um pouco de gelo neste frenesi escaldante, talvez “um balde de água fria” seja o que você mais precisaria, obviamente no sentido metafórico, mas se no sentido literal funcionar para você, vai fundo!
Como argumentado pelo psicólogo Walter Mischel, o sistema quente (emoções, impulsos e desejos) pode distorcer o sistema frio (pensamento racional) e fazer você usar a lógica para validar a sua ação impulsiva (Eu me esforço tanto na vida que mereço um agrado!”), mas se os pensamentos frios (“Ainda nem paguei as outras dívidas!”) forem levados a sério, o furor de desejo vai perdendo a sua força e você vai se distanciar psicologicamente das exigências imediatistas, recuperando o controle da situação. No final, esfriando-se um pouco você se dará conta do péssimo negócio que está por fazer, lembrando-se das outras vezes que fez o mesmo e das consequências negativas que colheu.
A expectativa e a antecipação da recompensa são, na maior parte das vezes, mais instigantes do que a própria recompensa. Resistir aos impulsos imediatistas, dando espaço à reflexão racional nos momentos de “sequestro emocional” é a resolução mais indicada para a manutenção do seu bem-estar futuro. Agradeça ao seu sistema límbico por todas as emoções que você experimenta e fazem da sua vida um evento tão significativo, mas não se esqueça que controle das coisas é obtido pelo equilíbrio entre o calor das emoções e a frieza dos pensamentos.
Pietro Leonardi Candido Olivetti