
03/08/2025
“Engole o choro! Engole sapo! Cale a boca! Cale o peito!
Mas o corpo fala, e como fala. Fala a ponta dos dedos batendo na mesa. Falam os pés inquietos na cama. Fala a dor de cabeça. Fala a gastrite, o refluxo, a ansiedade. Fala o nó na garganta atravessado. Fala a angústia, fala a ruga na testa. Fala a insônia, o sono demasiado.
Você se cala, mas o falatório interno começa. As pessoas adoecem porque cultivam e guardam as coisas não digeridas dentro de seus corações. O normal do ser humano seria a comunicação e conseguir dizer o que está sentindo. Mas nem todos se habilitam para esse difícil exercício. Nem sempre digerimos bem aquelas pequenas coisas, como mensagens mal respondidas, as palavras que machucam...
Você finge que não ouviu, engole e tudo isso vai se acumulando até que um dia enche. Esses pequenos fatos idigestos percorrem a garganta, entram no estômago, invadem o peito, e se deixarmos, calará nossa boca e nossa paz.
O importante é não deixar acumular ou achar que simplesmente vai aliviar com o passar dos dias. O tempo até tem um papel importante, mas não resolve tudo. Tentar mostrar que tudo sempre está bem requer muita energia, o desgaste emocional é grande. Não dá pra engolir tudo e dizer amém! Eu sei.
Também não dá pra cometer sincericídios por aí e sair vomitando as coisas entaladas na sua garganta. Mas dá para se expressar. Tem hora que o sentimento pede pra ser dito, entendido, descodificado, traduzido. Tudo que ele quer é ser exorcizado pela palavra ou pela via que lhe cabe melhor. Expressar tranquiliza a dor.
Dor não é pra sentir pra sempre. Dor é vírgula. Então faça uma carta, um poema, um livro. Cante uma música. Pegue as sapatilhas, sapateie. Faça uma aquarela. Faça uma vida. Faça piada, faça texto, faça quadro, faça encontro com amigos. Faça corrida no parque. Fale pro seu analista, fale para Deus, para o universo... se pinte de artista. Converse sozinho, papeie com seu cachorro, solte um grito pro céu, mas não se cale. Pois 'se você engolir tudo que sente, no final você se afoga'."
Ruth Borges
Tome florais!