Fórum Perinatal RS

Fórum Perinatal RS O Fórum Perinatal é um espaço coletivo de debate cujo objetivo é reunir gestores, profissionais de saúde e usuárias(os) do SUS

13/09/2019

A Organização das Nações Unidas (ONU) reconhece a violência obstétrica, nestes termos, como violação dos direitos humanos de mulheres e meninas em dimensão global. Em informe finalizado em julho de 2019, a relatora especial do Conselho de Direitos Humanos sobre a violência contra a mulher, Dubravka Šimonović, analisou mais de 128 denúncias oriundas de órgãos oficiais dos Estados, ONGs, instituições independentes e acadêmicas recebidas através do chamamento finalizado em maio de 2019. O documento foi apresentado durante a 74ª sessão da ONU, e considerado o primeiro dedicado à questão dos maus tratos e violência sofridos durante o parto, inserido em um contexto de violação dos direitos se***is e reprodutivos. O contexto brasileiro foi apresentado em documento elaborado pelo Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (NUDEM) da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, pioneira na abordagem sobre violência obstétrica no país.

Segundo o relatório, o abuso e violência contra a mulher nos serviços de saúde reprodutiva e durante o parto são examinados como "uma forma contínua de violações que ocorrem no contexto mais amplo de desigualdade estrutural, discriminação e patriarcado, e são também conseqüência da falta de educação e formação e da falta de respeito à igualdade de mulheres e seus direitos humanos. Mulheres e meninas sofrem esse tipo de violência quando solicitam outras formas de assistência à saúde, em exames ginecológicos, ab**to, tratamentos de fertilidade e contraceptivos e em outros contextos de saúde sexual e reprodutiva". Aponta ainda que, embora não haja um consenso sobre como definir e medir a violência obstétrica, a mesma está tão naturalizada que sequer é considerada violência contra as mulheres e, embora alguns atos violentos não sejam deliberados ou intencionados, constituem-se como violência em função das circunstâncias em que ocorrem, enquanto outros podem claramente ser considerados violações dos direitos humanos com base nas normas de direitos humanos e na jurisprudência em matéria de direitos humanos. A região da América Latina e Caribe é pioneira na tipificação desta violência, em cumprimento à Convenção de Belém do Pará, que resultou na promulgação de leis que penalizam a violência obstétrica em alguns países.

O ativismo e relatos de mulheres compartilhados através das plataformas sociais digitais foram fundamentais para demonstrar que maus tratos e violência durante o parto são práticas generalizadas e arraigadas nos sistemas de saúde, em diversos países. São destacados no documento casos de morte materna e fetal relacionados às condições de risco e abuso nos serviços de saúde; a misoginia e descaso relacionados à inércia na busca de outros modelos de assistência, menos medicalizados, e seu impacto na saúde física e mental das mulheres.

São consideradas como forma de tortura durante o parto práticas como: a sinfisiotomia (corte cirúrgico do osso pélvico, a fim de alargar a abertura para o parto) praticada em larga escala da Irlanda até a década de 80; as episiotomias de rotina e sem consentimento informado (corte realizado entre a va**na e o períneo), bem como o "ponto do marido"; a imobilização forçada de mulheres privadas de liberdade, em situação de imigração e nos casos de ab**to espontâneo, que são amarradas e amordaçadas à cama hospitalar; e, ainda, das mulheres e bebês encarceradas nos serviços de saúde por falta de condições de pagamento; além da violação dos direitos reprodutivos das mulheres submetidas à esterilização e ab**tos forçados e sem consentimento, em especial as mulheres pertencentes a grupos minoritários, como indígenas, ciganas (romani), mulheres com discapacidades e que vivem com HIV, consideradas por muitos profissionais como indignas de procriação, incapacitadas de tomar decisões responsáveis sobre anticoncepção, "sem condições de serem boas mães" ou terem descendência.

São citadas a manobra de Kristeller (pressão de fundo uterino), não recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) mas presente em até 70% dos partos em Honduras; o uso indiscriminado de ocitocina sintética; o abuso e indução às cirurgias cesarianas, consideradas forma de tortura quando realizadas sem consentimento e por manobra do ordenamento jurídico, que coloca os direitos das mulheres em detrimento e oposição aos direitos do feto. Também consideradas formas de tortura os procedimentos cirúrgicos realizados sem anestesia, nos casos de ab**to espontâneo, suturas do parto e extração de óvulos durante os procedimentos de reprodução assistida. O desrespeito à intimidade e confidencialidade, práticas humilhantes, agressões verbais e observações sexistas foram relatados por mulheres de diferentes partes do mundo, muitas em razão de seu nível socioeconômico e incapacidade de ler ou escrever, morar em zonas rurais ou bairros periféricos ou mesmo sua aparência, além de receberem ameaças, violência física e culpabilização por maus resultados sanitários.

O consentimento informado mostrou-se como um direito fundamental violado em muitas das denúncias recebidas, em que a renúncia ao mesmo é obtida através da assinatura compulsória dos formulários na admissão nos serviços de saúde, ou em momentos considerados inadequados à compreensão por parte das mulheres, como nos momentos das contrações; falta aos profissionais de saúde a capacitação para gestionar o consentimento informado mesmo em países desenvolvidos. O documento ressalta que o consentimento informado é um processo de comunicação e interação contínua entre paciente e profissionais, deve ser voluntário e mediante a prestação de todas as informações, de forma compreensível, acessível e adequada incluso nos casos de deficiência ou discapacidade. Pode ser retirado em qualquer momento, considerada a atenção centrada na paciente, cuja assinatura por si só não configura a indicação de consentimento informado.

As condições e limitações dos sistemas de saúde são apontadas como causas estruturais da violência obstétrica, dentre elas: as más condições de trabalho; a predominância de homens na atenção ginecológica e obstétrica, contrastando com as obrigações dos Estados em garantir a disponibilidade e qualidade dos bens e serviços, a capacitação adequada dos profissionais de saúde e o equilíbrio entre os gêneros; a falta de prioridade na atenção à saúde das mulheres baseada em direitos humanos; a insuficiência de recursos, o que viola as necessidades específicas de saúde e constitui discriminação; a falta de capacitação adequada em matéria de ética médica e direitos humanos, e a não obrigação de trabalhadores em prestar uma atenção respeitosa e não discriminatória.

Leis e práticas nacionais discriminatórias presentes em alguns Estados, como a necessidade de consentimento do esposo para a realização de procedimentos, retiram das mulheres sua autonomia e desconsideram sua capacidade de decisão, contribuindo para a ocorrência de maus tratos. A interseccionalidade apresenta-se nos casos de discriminação baseada em estereótipos, afetando mulheres que vivem nas zonas rurais, pertencentes às minorias étnicas e com discapacidades. As dinâmicas de poder que envolvem a valorização da autoridade médica relacionam-se com situações de impunidade e abuso nas situações que envolvem maus tratos às pacientes.

Marcos regionais e internacionais e a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável preveem o direito das mulheres à saúde sexual e reprodutiva livre de coação, discriminação e violência. Todavia, denúncias de casos em todo o mundo evidenciam as falhas nos países em garantir tal direito, com destaque para o caso Alyne da Silva Pimentel Teixeira, em que o governo brasileiro foi apontado como o responsável pela morte materna evitável desta mulher de ascendência afro, demonstrando a negligência e discriminação tanto no serviço público quanto privado, nos quais buscou atendimento. Destacam-se também as violações nos casos em que as mulheres são obrigadas a seguir com a gestação mesmo nas situações de malformação fetal e em decorrência de violência sexual; a falta de serviços para atender a esses casos; a dificuldade em acessar métodos anticonceptivos modernos; as esterilizações forçadas e sem consentimento e as obstruções à realização dos partos domiciliares atendidos por parteiras. Também foi citada a prisão de Imelda Cortez, em El Salvador, em decorrência de um ab**to espontâneo que a levou a buscar uma emergência obstétrica, e a preocupação em relação às leis restritivas e penalização do ab**to e seu impacto negativo na assistência às mulheres.

São reconhecidos os esforços que alguns países têm realizado para enfrentar essa realidade, tanto na forma de leis quanto de políticas e boas práticas, com destaque para a humanização da assistência ao parto e leis que reconhecem e penalizam a violência obstétrica, bem como sua investigação. Contudo, o acesso ao ab**to sem riscos segue como um desafio, e o avanço na melhoria dos serviços relativos ao parto não alcança outras esferas dos direitos reprodutivos das mulheres.

Conclui-se com a obrigação dos Estados em promover e prover serviços adequados, assim como combater, prevenir, penalizar e reparar os danos causados por esse tipo de violência, a partir de uma perspectiva embasada nos direitos humanos. São indicadas a cooperação entre as instituições, associações profissionais, organizações não governamentais e movimento de mulheres voltados à saúde reprodutiva e atenção obstétrica; a elaboração de estratégias nacionais para a garantia da atenção adequada; o enfrentamento dos problemas estruturais em torno deste problema, a saber: a discriminação socioeconômica, a falta de formação e educação adequada dos profissionais de saúde, a falta de pessoal qualificado, contingente e recursos suficientes destinados aos serviços de saúde materna e atenção ao parto.

Deve-se garantir a aplicação adequada do consentimento informado, respeitando a autonomia das mulheres e seus direitos, inclusive de estarem acompanhadas durante o parto; considerar a possibilidade e impedir a penalização dos partos domiciliares; supervisionar os serviços, monitorando seus indicadores em relação às cesarianas, partos va**nais, episiotomias e outros tratamentos. Garantir também a reparação às vítimas de maus tratos e violência, em particular a reparação econômica e o reconhecimento da conduta inapropriada, de modo formal; o acesso à justiça nesses casos, com responsabilização profissional e sanção das respectivas associações; investigar, exaustiva e imparcialmente, as denúncias das mulheres acerca da atenção recebida durante o parto; assegurar que os órgãos reguladores e instituições responsáveis pela supervisão dos serviços e políticas tenham recursos suficientes para fazê-lo; e sensibilizar advogado/as, juíze/as e cidadã/os sobre os direitos humanos das mulheres no contexto da atenção ao parto.

Sobre as leis discriminatórias e estereótipos nocivos de gênero, deve-se reforçar os mecanismos que proíbem todas as formas de maltrato e violência contra as mulheres; suprimir qualquer obrigação de obter autorização de cônjuge ou familiar em questões concernentes às mulheres; derrogar as leis que penalizam o ab**to em todas as circunstâncias, eliminando as medidas punitivas às mulheres que se submetem ao ab**to e, no mínimo, legalizar nos casos de violência sexual e risco à saúde física e mental, ou risco de vida à mulher, facilitando o acesso à atenção segura e de qualidade posterior ao ab**to; retirar a acusação penal e encarceramento das mulheres que buscam as emergências obstétricas nos casos de ab**to espontâneo, assim como as medidas punitivas aos médicos, a fim de assegurar a assistência necessária; proibir a esterilização forçada e as formas de discriminação interseccionais que atingem as mulheres pertencentes às minorias, proporcionando reparação àquelas que tiveram seus direitos humanos violados. Devem atuar nesse sentido todas as organizações e instâncias previstas no sistema internacional de direitos humanos, de forma cooperativa, para prevenir a violência e maus tratos contra as mulheres no parto, defendendo o direito humano de desfrutar do mais alto nível possível de saúde física, mental e reprodutiva.

O documento pode ser acessado na íntegra em https://undocs.org/es/a/74/137

A 20ª Edição do Fórum Perinatal do Rio Grande do Sul acontecerá no dia 18 de outubro, conjuntamente com o II Encontro Re...
10/10/2017

A 20ª Edição do Fórum Perinatal do Rio Grande do Sul acontecerá no dia 18 de outubro, conjuntamente com o II Encontro Regional da Rede Cegonha da 13ª CRS, no município de Venâncio Aires.

As inscrições devem ser feitas através do link: https://goo.gl/oDAgsR

15/08/2016
O Fórum Perinatal RS inscreveu seu relato de experiência no Prêmio InovaSUS 2015, pretendendo continuar sua itinerância ...
21/01/2016

O Fórum Perinatal RS inscreveu seu relato de experiência no Prêmio InovaSUS 2015, pretendendo continuar sua itinerância pelo Estado com a exposição Sentidos do Nascer, sucesso nas cidades de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Brasília.

Leia nosso relato, avalie o projeto e deixe seu comentário na página: https://novo.atencaobasica.org.br/relato/5437.
Sua participação é muito importante para sabermos como foi a experiência do Fórum em 2015.

Estamos ansiosos e na torcida de sermos um dos projetos contemplados com o edital!

15/12/2015

O Fórum Perinatal deseja trazer a exposição Sentidos do Nascer para o Rio Grande do Sul!

Inscrevemos nossa iniciativa no prêmio InovaSUS - para avaliar e apoiar, faça seu cadastro na página da Comunidade de Práticas e deixe sua nota!

Nos comentários, você ainda pode dar o seu relato de participação no Fórum. Venha nos prestigiar e fazer parte desta construção!

https://novo.atencaobasica.org.br/relato/5437

O Fórum Perinatal do Rio Grande do Sul vem realizando um importante trabalho de sensibilização para o diálogo entre gestores, trabalhadores e usuárias(os) do SUS, e pretende, com a exposição Sentidos do Nascer, ampliar a discussão sobre a humanização do parto em sua rota de itinerância pelo Estado

Divulguem e compareçamI Simpósio sobre Maternidade, Crack, Gênero e Institucionalização  Data: 24/09/2015Local: Teatro d...
22/09/2015

Divulguem e compareçam

I Simpósio sobre Maternidade, Crack, Gênero e Institucionalização

Data: 24/09/2015
Local: Teatro do Foro Central Prédio II
Endereço: Rua Manoelito de Ornellas, 50-Térreo

PROGRAMAÇÃO PRELIMINAR

MANHÃ

8h30 - 9h – Mesa de Abertura: Ministério da Saúde, Ministério da Justiça, Secretaria Estadual da Saúde, Secretaria Estadual da Justiça e Direitos Humanos, Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, Tribunal de Justiça, Gabinete de Políticas Sociais

09h – 10h30h. – Maternidade e Crack: Cenário Nacional
Esther Vilela - Coordenadora da Saúde da Mulher do Ministério da Saúde
Representante da Coordenação da Saúde da Criança do Ministério da Saúde
Mediadora: Nadiane Lemos (SES/RS)

10h30 - 12h – Maternidade e Crack: o Olhar da Justiça
Cláudia Barros - Defensora Pública do Estado do Rio Grande do Sul
Patrícia Martins - Juíza da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre
Representante do MP
Mediador: Rubens Bias (CONANDA/MS)

12h - 13h30min. – INTERVALO PARA O ALMOÇO


TARDE

13h30 - 14h30min - Maternidade, Crack, Cárcere e Linha de Cuidado
Rosangela Peixoto - Ministério da Justiça
Roberto Alexandre Vucetic - Assistente Social do Tribunal de Justiça
Leila Almeida e Renata Maria Dotta Panichi (SES/RS)
Mediador - Marden Filho (MJ)

14h30min – 15h30min Entendendo os efeitos no crack na gestação e no desenvolvimento da criança
Gabrielle Bocchese – Pediatra e Dra. em Pediatria (UFRGS/HMIPV)
Mediadora: Eleonora Gehlen Walcher (SES/RS)

15h30min. 16h30min - Relatos de experiência das maternidades: gestantes usuárias de crack
Hospital Materno Infantil Presidente Vargas
Hospital Nossa Senhora da Conceição
Hospital de Clínicas
Hospital Santa Casa de Misericórdia
Mediadora: Gisleine Lima da Silva (SES/RS)

17h - Encerramento

Informações e inscrições:
Secretaria Estadual da Saúde - Departamento de Ações em Saúde
(51). 3288.5903
e-mail: redecegonha@saude.rs.gov.br

Ficha de inscrição: https://docs.google.com/document/d/1KjbyGptDLDoliIMVvC7tRyS8kDzSUp2VCB755G0O2VE/edit?usp=sharing

Endereço

Porto Alegre, RS

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