30/05/2021
João era um bebê saudável até meados de 2020. Nessa época, com cerca de 1 ano e meio, começou a me preocupar com sinais de atraso no seu desenvolvimento.
Falava apenas 2 palavras. Balbuciava um tatibitate monótono. Não atendia a seu nome nem olhava nos olhos. Andava na ponta dos pés. Sorria pouco, não fazia gracinhas. Na consulta não se interessava pelas brincadeiras, Começou a recusar qualquer tipo de legume.
Conversando sobre a rotina, descobri que os pais estavam fechados em casa, como a maioria das famílias, e haviam perdido a rede de apoio. João estava confinado há meses. Havia quebrado o fêmur, e por 8 semanas ficou inteiramente parado. Com os pais em home office, a solução foi a TV: João passava 5 a 6 horas por dia em frente a ela. Com a dificuldade na alimentação e pouca ajuda em casa, a mãe apelou para biscoitos, nuggets e miojos. O sono era interrompido, acordava várias vezes por noite chorando.
A situação era preocupante: havia critérios para suspeitar de Transtorno do Espectro Autista. Pedi uma audiometria, que foi normal. Uma neurologista disse que o diagnóstico era provável e encaminhou para estimulação precoce com fono e TO.
Mas havia um caminho a percorrer antes disso. Com os pais, organizamos uma reviravolta na vida de João. A TV foi desligada - o que causou muito choro e irritação - mas os pais resistiram. Uma avó veio de outro estado em socorro. Ela e os pais passaram a dar mais atenção ao menino, o estimulavam com brincadeiras, livrinhos, instrumentos musicais, bonecos e casinhas. A avó começou a levá-lo duas vezes por dia na pracinha, onde encontrou um “amigo de pandemia”. Pedi que a família não usasse mais ultraprocessados, para que o paladar voltasse aos poucos ao natural.
João, agora com 2 anos e meio, saiu daqui há pouco: falando frases completas, sorridente, brincante. Entrou para a escola - que adora - em fevereiro, come e dorme muito bem.
Não foi milagre. Foi apenas uma decisão da família, que, orientada por um profissional, decidiu oferecer uma vida melhor para seu filho. Uma vida com conexão, natureza, brincadeira, socialização, comida de qualidade. Essa soma se chama saúde, física e mental.
Ou melhor: uma infância feliz.