08/07/2025
SOBRE A PRIVATIO BONI E A REALIDADE PSICOLÓGICA DO MAL
Hoje, como em todas as épocas, é necessário que o homem não feche os olhos para o perigo do mal que está à espreita dentro dele mesmo. Infelizmente este perigo é demasiado real, e por isto a psicologia deve insistir na realidade do mal e refutar qualquer definição que deseje conceber o mal como algo sem importância ou mesmo como não existente. A psicologia é uma ciência experimental que lida com coisas reais. Por isso, como psicólogo que sou, não tenho a intenção, nem tampouco a qualificação para me imiscuir no
terreno da metafísica. Só me torno polêmico quando a metafísica se intromete no campo da experiência e lhe dá uma interpretação que não se justifica absolutamente por via empírica. A crítica que faço contra a doutrina da privatio boni só é válida até onde a experiência alcança. Do ponto de vista científico, a argumentação usada é, como todos poderão ver, uma petitio principii da qual, como é sabido, sempre se extrai aquilo que nela se colocou. Tais argumentos carecem de força de persuasão, mas a circunstância de que não somente se usam semelhantes argumentos, mas de que neles se acredita sem sombra de dúvida, constitui para mim um aspecto sobre
o qual não posso simplesmente fechar os olhos. Ele é indício de que existe uma tendência a priori no sentido de dar preferência ao “bem”, e isto através de todos os meios próprios e impróprios de que se dispõe. Por isso, aferrando-se à doutrina da privatio boni, a metafísica cristã expressa a tendência de aumentar cada vez mais o bem e de diminuir o mal. A privatio boni pode ser, portanto, metafisicamente verdadeira. Mas, de minha parte, não ouso formular nenhum juízo a este respeito. Devo apenas insistir que, no campo de nossas experiências, o branco e o preto, a luz e as trevas, o bem e o mal são pares de contrários, sendo que um sempre pressupõe o outro.
Jung, Aion, § 98.
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Anderson Santiago da Silva
Psicólogo (CRP 02/181788), professor universitário, supervisor clínico e especialista em Psicologia junguiana com enfoque na clínica