12/06/2024
O que ninguém celebra no dia dos namorados é a dor que permeia o amor. É necessário, lindo e importante celebrar o amor na sua face instagramável, mas e celebrar o desafio da transformação de vida que permeia o amor? E o processo de morrer e reviver todos os dias no relacionar-se com o outro? Se apaixonar é uma sensação de adrenalina que nos impulsiona e nos encoraja a viver com o outro. A paixão entra e não pede licença, basta uma fresta aberta, é suficiente para ela que ela entre e vire tudo de ponta cabeça. A paixão remexe estruturas, desperta a coragem, traz a admiração, a magia do olhar para o belo no outro. A paixão é como um lampião na parte escura da alma. Tudo o que não era conhecido até então, se apresenta. Todos os desejos não sentidos e negligenciados.
Na magia da paixão, enxergamos no outro todas as potências e dores que na verdade estão escondidas em nós mesmas. Ignoramos a realidade das fraquezas do outro, elas ficam pequenas demais diante de uma emoção tão avassaladora quanto o desejo de estar com esse outro que é tão deliciosamente encantador. No encanto, descobre-se similaridades e gostos em comum, os sentidos se aguçam e desperta o desejo de vida na sua mais pura essência. Mas, a paixão não permanece assim por muito tempo, não há ego que suporte tamanha energia psíquica. Logo, o amor pede caminho e ele vem trazendo a realidade, pedindo escolhas, mortes e renascimentos. Ele vem derrubando as máscaras, escancarando as maiores fragilidades de cada um, movimentando a raiva, a tristeza e reatualizando a culpa da nossa infância. E sobre isso quase ninguém fala! Quando estamos em conflito com o outro, na verdade, são nossas crianças interiores em conflito. E se isso tudo ficar inconsciente, ao invés de ser transformação pessoal, se resumirá em julgamentos mútuos e anulações pessoais para evitar a separação que nos abre ainda mais a ferida da rejeição, que na verdade, já está sendo atualizada juntos. Sem o diálogo da consciência com o inconsciente, tudo vira apenas dor e paralisação ou uma vida sem novas transformações. E mesmo que nas redes sociais estejam todos mostrando viver alegres no dia dos namorados, no fundo dos corações existe também confusão, raiva, culpa e tristeza. Alguns inconscientes da tarefa, estão paralisados apenas na sombra, perdendo o mais incrível de viver a dois, o transformar-se individualmente para juntos construírem uma conjugalidade. Mas, para os muitos casais que estão conscientes da tarefa do amor, vivendo com garra a beleza da transformação em suas faces de luz e sombra, dialogando com o movimento de construir uma ponte entre si mesmos e o inconsciente e o consciente. Acredito sim, que será mesmo um feliz dia dos namorados. E para as mulheres solteiras ou em relações paralisadas eu desejo que cuidem de suas feridas da infância, para que a adulta tenha os olhos da intuição atentos às armadilhas das sombras do amor. Quanto mais conscientes estivermos de nós mesmas, mais teremos autonomia para vivermos bem sozinhas. E se a paixão chegar saberemos voltar a consciência de nós mesmas, sem nos perdermos no outro. Ouso dizer, não desistam do amor em todas as suas faces, mas lembrem-se que amar nossa criança interior e cuidar dela tem que ser nossa prioridade, para conseguirmos assim sermos adultas seguras para se posicionar diante do amor.
Thais Domingos, psicóloga clínica de orientação junguiana.