31/01/2024
O muro tem por função a delimitação de um espaço, diferenciar o coletivo e o individual. Fala também de propriedade: a distinção entre o que é meu e do outro. Esse discernimento é um atributo básico quando pensamos no desenvolvimento da psique.
Ao identif**ar o “eu” e distingui-lo dos demais elementos do mundo, a criança levanta as primeiras cercas, ainda bastante frágeis, mas que virão a determinar o território no qual poderá erguer seu legado.
Aos poucos, essa cerca será substituída por edif**ações mais sólidas, que conferem um nível maior de segurança e proteção a quem neles habita. As experiências servirão de alicerce e os afetos serão a matéria-prima para erguer essa estrutura.
Precisamos de muros para nos sentirmos minimamente seguros diante das intempéries. Eles nos dão a capacidade de distinguir o que precisa f**ar de fora, e, assim, preservamos aquilo que nos é mais caro.
Sem essa separação, f**aríamos diluídos nas questões dos grupos aos quais pertencemos. Todas nos invadiriam e seria impossível explorar as potências da nossa individualidade.
Podemos, entretanto, construir muralhas impenetráveis, dignas de fortalezas, especialmente quando a vida for dura, dolorosa. Experiências norteadas pelo medo nos fazem instalar mais uma fiada de pedras acima: buscamos proteção daquilo que apresente potencial nocivo.
Convém ressaltar que o medo não é, necessariamente, resultado de vivências sofridas. Quando contextualizadas, ganham sentido e são assimiladas positivamente como situações válidas para nosso desenvolvimento.
O que dará a medida certa do nosso muro é a capacidade de defendermos nossos valores, e isso tem uma ligação direta com a forma como nos relacionamos com eles.
A verdadeira segurança não está na muralha impenetrável, nas lanças ou cerca elétrica: está em encontrarmos a nossa capacidade de reconstrução como algo além do poder de subtração do outro.
Além do tamanho adequado, bons muros não perdem a capacidade de comunicação com o mundo exterior. Exageramos quando não conseguimos reconhecer a língua, a crença, os valores do nosso vizinho. E quando, especialmente, perdemos a chance de enxergar a grandeza do horizonte.
por João Rafael Torres