28/02/2024
"Quando aceito em mim o ínfimo, enterro um germe no chão do inferno. O germe é invisivelmente pequeno, mas dele nasce e cresce a árvore de minha vida que liga o inferior ao superior. Em ambas as extremidades há fogo e calor máximo. O superior está em fogo e o inferior está em fogo. Entre os fogos insuportáveis cresce tua vida. Entre esses dois polos estás dependurado. Num movimento aterrador sem limites oscila para cima e para baixo o pendente distendido. Por isso a gente teme nosso ínfimo, pois é sempre uno com o caos aquilo que não possuímos, e toma parte em seu fluxo e refluxo enigmáticos. Aceitando em mim o ínfimo, precisamente aquele sol avermelhado-incandescente da profundeza, e sucumbindo por causa disso à confusão do caos, também nasce para mim o sol que brilha no alto. Por isso quem aspira ao mais alto encontra o mais profundo. Para salvar as pessoas de sua época do pendente distendido, o Cristo tomou realmente sobre si este tormento e ensinou: "Sede espertos como as cobras e sem falsidade como as pombas". Pois a esperteza aconselha contra o caos, e a ingenuidade oculta seu aspecto horrível. Portanto, as pessoas podiam andar pelo seguro caminho do meio, com limite para cima e para baixo. Mas os mortos de cima e de baixo se multiplicaram, e sua exigência tornou-se cada vez mais veemente. E levantaram-se pessoas distintas e infames que, sem o saber, transgrediram a lei do meio. Abriram portas para cima e para baixo. Levaram muitos com eles para o delírio superior e inferior e semearam assim a confusão e prepararam o caminho daquele que está para chegar. Mas quem entra no um e não ao mesmo tempo no outro, enquanto aceita aquele que lhe vem ao encontro, só ensinará e viverá o um, e disso fará uma realidade. Pois ele se tornará vítima do um. Se tu entras no um e por isso consideras como inimigo o outro que lhe vem ao encontro, combaterás o outro. Pois não vês que o outro também está em ti. Tu achas que ele vem de qualquer modo de fora e tu achas que o vês também nas opiniões contrárias a ti e nas ações de teus concidadãos. Lá o combates e estás totalmente cego. Mas quem aceita o outro que lhe vem ao encontro, porque também já está nele, este já não combate, mas olha para dentro de si e se cala."
Jung - O livro vermelho págs. 316/317 edição sem ilustrações.