02/04/2025
A sutileza do cineasta em contraste com a brutalidade das autocracias.
Aldo Ambrózio*
Walter Salles e toda a equipe responsável pela forja do filme “Ainda Estou Aqui” mereceram o Oscar de melhor filme estrangeiro e demais premiações mundo afora.
Ele soube - com a sutileza do artista magistral que é - dar um murro sublime no fascismo em ascensão na geopolítica mundial.
Aproximou o público do horror de um regime autocrático (sequestro, tortura e ocultação de cadáveres) contudo, não despertou o medo e a desesperança, muito pelo contrário, inspirou um afeto démodé em tempos neoliberais, no caso, fez o público sentir o grande sentimento da compaixão.
Não sei se Walter Salles é leitor de Espinosa, agora, aprendeu como poucos uma das principais lições da Ética: os afetos e paixões tristes despertados pelos regimes políticos ditatoriais só podem ser curados/combatidos com um mais intenso, com sinal invertido e direcionado em sentido contrário!
Dito isso, no pensamento por imagens do destacado cineasta, o horror da ditadura civil-militar-empresarial brasileira foi combatido com a sutileza poética da história de luta de uma mulher (Eunice Paiva) para que o Estado brasileiro reconhecesse a responsabilidade pelo rapto, tortura, assassinato e ocultação do cadáver de seu marido (Rubens Paiva).
Nesta tragédia brasileira - porém universalizada pela precarização acelerada das condições materiais de vida dos terráqueos no tempo presente - conduzida pela delicadeza poética de Salles; Antígona derrotou o Tirano Creonte.
Eunice Paiva (Fernanda Torres) angariou forças e formação e não deu trégua em sua luta pessoal até fazer com que o Estado brasileiro - tiranizado pela canalha militar a tomá-lo de assalto no Golpe de Estado de 1964 – responsabilizasse-se pelo ocultamente e desaparecimento do corpo de seu marido e apresentasse o seu atestado de óbito tardiamente já em tempos de abertura democrática nos idos de 1994.
Oxalá a luta desta mulher se multiplique e inspire outras muitas que levem à derrota os sucessores de Creonte - surgindo com uma certa frequência num presente marcado pela ascensão planetária da extrema direita.