31/05/2025
Esse fenômeno dos reborn dolls — bonecos hiper-realistas tratados como bebês de verdade — não dá pra reduzir “hobby curioso”. A psicanálise pode olhar pra isso a partir de várias lentes.
Primeiro, podemos pensar na função simbólica do boneco. Para algumas dessas mulheres (e sim, em geral são mulheres), o bebê reborn representa um objeto transicional, no sentido que Winnicott propôs. Ele ajuda a mediar um vazio, uma perda, ou até uma fantasia não realizada: pode ser a dor por não ter filhos, a perda de um bebê, ou um desejo de maternidade que não se concretizou no real.
Lacan acrescentaria que o bebê é um “objeto a”, um objeto de desejo, que tenta preencher uma falta estrutural. Mas claro, essa falta nunca se preenche de verdade — e o boneco funciona como um substituto imaginário. Não é o bebê real, mas um suporte para a fantasia.
Outro ponto é o investimento libidinal no boneco: vestir, alimentar, cuidar, é uma forma de encenação do maternar. Uma espécie de atuação da fantasia inconsciente. Em muitos casos, o que vemos é a tentativa de controlar no simbólico algo que, no real, é marcado pela falta de controle — como a maternidade com todas as suas incertezas, riscos, frustrações.
Agora, é importante distinguir: isso pode ser uma elaboração saudável de uma perda, como num processo de luto simbólico, ou pode se aproximar de um fenômeno de fetichização, onde o objeto ganha uma carga desproporcional e rígida, congelando o sujeito numa posição melancólica ou maníaca.
Na psicanálise, não se trata de “patologizar” a mulher que cuida de um bebê reborn, mas de compreender o lugar psíquico que esse objeto ocupa para ela.
́demental