02/12/2021
A busca de não sentir dor.
Nas décadas de 1970 e 1980 se costumava dizer que o melhor negócio do mundo era uma companhia de petróleo bem administrada; o segundo melhor negócio do mundo era uma companhia de petróleo mal administrada e o terceiro melhor negócio era uma companhia de petróleo jogada às traças.
O mundo mudou muito nestas últimas décadas e outra indústria ganhou terreno e também o lugar de melhor negócio do mundo: a indústria das dr**as, as ilícitas mas também as lícitas. Estou me referindo obviamente ao narcotráfico e à indústria farmacêutica respectivamente. Elas dividem o primeiro lugar entre as indústrias mais poderosas do planeta e também as mais ricas.
Embora em lados opostos da lei, elas possuem outros dois pontos em comum: a anestesia da realidade, da dor de existir e a manutenção da dependência dos usuários.
As ilícitas, são sedutoras porque prometem o nirvana, mesmo que temporário e fugaz. Com elas os sujeitos encontram, por momentos, uma paz ou uma euforia que eles acreditam não ser possível por seus próprios meios. E as consequências são conhecidas mas desconsideradas: dependência e degradação como ser humano pensante,
As lícitas, e aqui me refiro às dr**as psiquiátricas, não ficam por baixo em termos de dependência e amortecimento geral da plena consciência. Vão desde dr**as para diminuir a ansiedade, a “inofensivos” remédios para conseguir dormir, só para citar alguns.
Um espírito observador pode perceber que as gerações mais novas, a grosso modo pessoas com 40 anos ou menos, e especialmente as mais novas, não suportam nenhum tipo de dor, em especial a dor “emocional” ou, melhor dizendo, a dor psíquica.
Falando pela minha experiência, recebo com frequência ligações de pessoas que, talvez por não saberem o que é um psicanalista, me procuram para que eu prescreva uma receita de remédio para ansiedade, para dormir, ou já dizem o nome da medicação que querem. Quando interpeladas se não gostariam de conversar e falar de seus problemas ao invés de irem direto para a medicação, todas, sem exceção, reiteram que querem apenas a receita para o remédio tão desejado.
Parece que chegamos a um ponto, na sociedade atual, que a dor não é suportável, que o sujeito vai entrar em colapso se falar de seus problemas com um profissional da área psi. E algumas vezes, o próprio profissional, ele mesmo não suporta ouvir a demanda do paciente.
A dor de existir, e a alegria de existir, são inerentes a vida. As angústias que cada um sente, paciente e profissional, precisam ser escutadas e não abafadas com dr**as, por mais lícitas que sejam.
Psicanalista Eduardo Fortkamp