02/08/2025
Ferenczi, psicanalista húngaro, foi o primeiro a explorar a ideia de identif**ação com o agressor em seus trabalhos, buscando compreender a dinâmica de submissão e repetição do trauma em pacientes abusados.
Esse mecanismo de defesa pressupõe a transformação da realidade insuportável em vivência fantasiosa e a minimização da responsabilidade do abusador em detrimento de um movimento de autoculpabilização. A incorporação da culpa do agressor, mesmo sendo na realidade uma vítima - explicam a dificuldade de falar sobre a agressão.
Na série “Entre Estranhos”, Candy vive um relacionamento abusivo onde não apenas ela, mas também o seu filho, Danny, f**am a mercê do abusador sem que ela consiga minimamente protegê-lo. O abuso retratado é uma reencenação de outros abusos já sofridos em tenra idade e, na impossibilidade de acolhimento através de um adulto cuidador, resta a criança incorporar a culpa como mecanismo de preservação ou a dissociação e consecutiva fragmentação do “eu”. Nesse último, há possibilidade da incorporação de novas personalidades que sirvam como escudo protetivo do que restou do “eu”.
A série retrata tanto o silenciamento da vítima pelo sentimento de culpa (Candy), quando a fragmentação da identidade do seu filho, Danny, diagnosticado com Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI). Por ser baseado em fatos reais, o filme é um soco no estômago diante de tantas camadas de violência perpetuadas.
Não raro, adultos que passam esse processo traumático chegam à clínica questionando a si próprios quanto a veracidade dos fragmentos de memória que insistem em aparecer. O que se repete é a fissura de algo que ainda não pôde ser nomeado. Através da clínica , na presença de uma testemunha sensível, é autorizado que o trauma e a culpa encontrem escuta e tradução. 🤍