09/10/2025
🤔 Por que o anonimato do assassino de Odete Roitman causou tanto impacto nas redes? E por que a morte da vilã provocou mais comoção do que toda a crueldade que ela própria espalhou?
Se Freud nos ensinou a importância do herói como totem das ideias culturais, a imortal Odete nos ensina algo diferente.
A nova leitura da vilã encarna, sob uma forma cômica e sofisticada, traços que todos preferimos desconhecer em nós mesmos: a crueldade disfarçada, o narcisismo desmedido, a coragem egocêntrica e a ausência de culpa. Há nela uma potência de identificação que nos desarma. Sua performance nos permite contemplar, com fascínio e certo prazer, aquilo que normalmente reprimimos — e talvez por isso a assistamos não apenas com horror, mas com uma estranha simpatia.
A ficção, nesse caso, oferece um espaço de experimentação ética. Rimos de Odete, mas também rimos com ela, porque reconhecemos — ainda que de modo disfarçado — o gozo que pode emergir do sofrimento alheio. Essa ambiguidade torna seu assassinato tão significativo: ele não representa apenas a morte de uma personagem, mas o destino da crueldade que nela encontrava expressão — e que, de algum modo, também nos habita.
Além disso, permanece a dúvida: será que ela realmente morre? Esse impasse alimenta o desejo de continuidade — afinal, a crueldade vive enquanto houver vida.
No fim, Odete, viva ou morta, torna-se imortal. Sua morte nos alivia da identificação com uma crueldade sem freios — afinal, quem comete tamanha façanha não sobrevive para contar a história. Assim, seguimos protegidos, ainda que provisoriamente, de nossa própria crueldade — até que outro vilão venha despertá-la.
Talvez seja por isso que o anonimato de quem a matou nos encanta tanto: ele nos permite, por um instante, ocupar o lugar daquele que ousa eliminar o que em nós mesmos não podemos confessar.