09/02/2025
A coisa mais linda que vão ler, pela nossa querida Rosinha.
(Tive dificuldade em decidir onde parar de copiar o texto do seu livro porque é todo ele uma delícia…)
Parabéns pelos seus 103 anos, querida Matriarca!
Sou tão grata pela sua confiança no meu trabalho 💐

“
Prefácio
O meu nome é Rosa do Carmo, tenho 100 anos, nasci
no dia 6 de fevereiro de 1922, mas só fui registada no dia 5 de março do mesmo ano. Sou filha de Inocêncio Augusto e de Margarida de Jesus. Nasci no lugar da Fraga, onde os meus pais viveram. Só o meu pai nasceu no lugar de Vilarinho, freguesia de Barrô, concelho de Resende.
A minha vida foi sempre dura.
Comecei a trabalhar muito pequena, a fazer recados.
Vinha o comboio do Porto com as malas do correio, cada mala era deixava em cada freguesia ou em cada estação até à Régua.
As malas do correio vinham num vagão vermelho e eram distribuídas em cada estação de cada freguesia. Havia uma mulher que vinha à estação todos os dias buscar a mala do correio e atravessar o rio de barco para ir buscar a mala à estação de Barqueiros que chegava perto das 11h30. O correio
era depois distribuído numa casa particular em Vilar, na venda da Sra. Rosinha Miranda.
Primeiro davam-nos o Comércio do Porto, e nós esperávamos até ao fim para ver se havia mais cartas. Se existissem, colocavam as cartas ou outro correio dentro do jornal para nós trazermos e entregarmos aos Senhores. O Sr. onde eu levava o correio, era o dono das Quintas onde o meu pai trabalhava e era feitor dos homens
que trabalhavam nessas quintas.
A minha aldeia é muito linda, mas muito pobre. Primeiro tínhamos os cavoucos à beira do rio para semearmos milho para alimentação das pessoas. Semeávamos milho, feijão, botelhas para os porcos e as pessoas. Depois de vir a barragem, o rio deu cabo de tudo. Cobriu os cavoucos todos do Piar até ao Bernardo.
Era uma alegria embora fosse trabalhoso, porque era tudo feito à enxada pelos homens. Mas era uma grande alegria, tudo cantava nos trabalhos onde aprendi estas cantigas que nunca mais me esqueci.
Naquele tempo era uma alegria para as crianças, nós éramos 7 irmãos. O meu irmão mais velho sabia
tocar muito bem realejo, vinham as moças de outros lugares para a Fraga, cantar e dançar. Foi assim que eu aprendi.
Quando vinham os barcos à vela do Porto, buscar o
vinho fino à Régua, chegavam ao nosso cavouco em frente a Barqueiros, tocavam a corneta para os bois irem cabeá-los com as cordas até ao Bernardo, porque daí até à Régua já tinham vento na vela.
No meu tempo não havia transporte para o vinho, eram os bois que levavam as pipas até ao Bernardo, e, depois, havia lá no rio um barco rabelo muito grande que atravessava os carros dos bois com as pipas para a estação de Barqueiros.
Depois colocavam umas tábuas na beira do rio e do Barco Rabelo para os bois puxarem as pipas que vinham no carro e passarem para a Estação de Barqueiros. Depois dos bois descarregarem as pipas, estas iam para o Porto no comboio, chamado o comboio carroção porque era descoberto e servia
só para transportar as pipas. Os bois iam jungidos na cabeça com as molhelhas e voltavam a atravessar o rio no Barco Rabelo já sem as pipas. O jugo que se punha na cabeça dos bois, neste tempo era muito lindo na minha terra.
No fim da vindima havia a tiragem do milho que, as espigas eram acartadas às costas pelos homens para a eira. Depois era a noite das encapotadas das espigas. Quando aparecia uma preta, era o que os rapazes queriam para dar um abraço às raparigas. No fim das encapotadas, davam figos secos, nozes
e vinho fino e, no fim haviam cantares até de madrugada
Era assim a minha aldeia.
No meu tempo de criança os pais não eram obrigados a pôr os filhos na escola. Só iam os filhos dos ricos a quem nós chamávamos meninos. Os pobres eram moços e moças, então o meu Pai dizia que as moças não precisavam de saber ler porque começavam a namorar mais cedo.
(…)”