19/12/2025
Sobre a maternidade:
Há dias que me sinto feia. Há dias em que nada me f**a bem e fico cansada de não me sentir bonita com nenhuma roupa.
E nesses dias descubro o quanto o corpo deixa de ser só meu. Ele passa a ser território de mudança, de transformação, de algo maior do que controlo. Há uma estranheza profunda: continuo a ser eu, mas não exatamente a mesma. O espelho mostra-me uma versão minha que não reconheço totalmente e isso toca na identidade, na autoestima: Quem sou eu agora? Já não sou a Sophie-antiga mas também ainda não sou a Sophie-mãe. É uma espécie de limbo ingrato onde a única e melhor coisa que podemos fazer é esperar.
A gravidez obriga a essa rendição/espera. Talvez seja esse o verdadeiro ponto de dor para tantas mulheres e posso falar por mim: não confiar totalmente na nossa capacidade de tolerar isto. A sensação de que sentir coisas desagradáveis é demasiado, que não quero senti-las, que quero fugir. Sinto impaciência, medo do desconforto, dificuldade em lidar com a perda de controlo. Há uma parte de mim que sabe que precisa de largar, de se entregar, mas isso não é simples. O corpo muda, o tempo avança devagar, ele ainda não nasceu e parece que esta espera não acaba. Eu queria já sentir-me “eu” de novo, com a minha energia habitual, com o meu corpo familiar, mas sei que ainda vai demorar e isso cria inquietação. Surge o medo de colapsar, o medo do que me pode acontecer psicologicamente, como se existisse uma linha invisível que eu pudesse atravessar sem saber quando.
Às só me apetece acordar e sentir-me melhor neste corpo novo, que ainda não reconheço como meu, mas que está a fazer algo extraordinário. Aprender a confiar que eu consigo atravessar isto, mesmo quando dói, mesmo quando assusta, mesmo quando me sinto impaciente. Acreditar que a minha mente aguenta, que eu não vou colapsar, que estou a crescer por dentro tanto quanto ele cresce em mim. Quero continuar, quero ser mãe, quero amar este processo com mais serenidade mesmo quando ele não é confortável. E talvez a resposta esteja exatamente aqui, nesta honestidade crua, nesta ambivalência que não invalida o amor, só mostra o quanto tudo isto é grande.