
13/07/2025
LÁ FORA CÁ DENTRO
“Se a consciência da finitude do humano se constitui como a primeira e a última das angústias em face da qual se organizou toda a dimensão simbólica da espécie (religião, filosofia, arte, ciência, psicanálise), do ponto de vista do indivíduo, a aceitação da inevitabilidade da morte determina o valor relativo da vida e organiza o seu próprio sistema de crenças e de valores.
No despertar da angústia de morte do próprio, a perda de um filho não só inverte como perverte a economia simbólica da condição humana. Desorganiza pela raiz, desmente o sentido da vida, frágil equilíbrio milenarmente (con)vencido às garras do tempo.
Transforma-se na aniquilação da espiral do Tempo, na morte do futuro. Pode perceber-se esta dor como uma amputação num órgão vital: o da própria fertilidade, criatividade, felicidade, humanidade. Gera um estado de orfandade no núcleo vital do self. Morrendo um filho, morremos enquanto pais e enquanto filhos do nosso self parental também.
(…) O luto por um filho obriga à revisão e ao desligamento das partes mais criativas e idealizadas de cada um de nós. Impele ao confronto com o sentimento do maior desamparo, pela identificação aos modelos parentais não protectores e securizantes.”
Conceição Tavares de Almeida, 2009, “O Luto por Morte de um Filho: A Perda Absurda”, Revista Portuguesa de Psicanálise, 30 [1] - 125-142.
Imagem: Diogo Jota, 1996-2025, BBC, 3 de julho de 2025, todos os direitos reservados.